quinta-feira, 30 de maio de 2013

MESA DE BAR



Isaias Coelho Marques

Olhares dispersos
em um segundo
voltados para o abismo.

Três homens,
mesa indistinta,
vácuo em volta.
Novamente gestos,
sorrisos,
inflexões.

Apenas um segundo:
o abismo,
o vácuo

e a mesa de bar...

quarta-feira, 29 de maio de 2013

O CAUSO DO PINTO GAGÁ





Manoel Emílio Burlamaqui de Oliveira
(do livro “De Corpo Inteiro”)

                Saí da vida adormecida de um velho aposentado (do INSS) para o reboliço do Rio de Janeiro, a fim de, com minha mulher e meu filho Pedro, assistir o casamento de minha filha, Gilda, com o Fernando, e participar da linda festa, oferecida pelo casal aos convidados, sem jamais imaginar que, na escala de Brasília, pudesse acontecer o causo que vou lhes contar, não sei se envergonhado, decepcionado, ou emputecido... só sei que vou processar o aeroporto de Brasília, ah, isso vou!
                Duas horas de espera para pegar o voo que nos levaria ao Rio. Lanche pra cá, lanche pra lá, quem não fica com vontade de ir ao banheiro? Olhei para o relógio, faltavam ainda, uns 20 minutos para a nova decolagem, e lá vou eu, carregando sacola, blusão de frio (por precaução) e minha bengala, em busca do “cavalheiros”.
                Encontrei, entrei, e, surpresa, pequeno, para poucos visitantes. Entrei na fila, que, ainda bem, andou depressa, e, com uma mão (a outra estava ocupada com os trambolhos), procurei pelo pinto, que, então, já era pintainho, sem conseguir achá-lo, busca essa que me consumiu alguns minutos e, uma agravante, chamou a atenção dos demais xixizantes. Valha-me meu santo milagroso, será que vou me molhar? Eis que, o colega do lado, junto a uma meia-parede, termina seu afazer e sai, deixando uma vaga preciosa, pois tinha onde colocar minha bengala, (pendurada na parede), a sacola e o blusão, no canto, para, com as duas mãos, vazias tentar agarrar aquele pinto fujão.
                Foi o que fiz: calças arriadas nas pernas, procura que procura, agarro o safado e o coloco no lugar apropriado para abrir o bico... Suspirei, aliviado, mas escutei um suspiro mais elevado, de quem? Dos espectadores, cretinos, gozando do pobre velho... Tem nada não, que saio já. Quem disse? O safardana daquele pinto, só podia tá gagá, não abriu o bico, o xixi não saia. Nova expectativa, e os cretino passaram a fazer xiii, xiii, xill... Teve, até, um que cantou “mourão, mourão, vara madura não cai, mourão, mourão, catuca por baixo, que sai” – “Vai catucar teu pai, cretino!” Risadaria geral, mas serviu, pois o xixi saiu.
                Pensei que minhas atribulações haviam cessado. Quem disse? O gagá se recusava fechar o bico... olhei de soslaio, e os visitantes daquele banheiro, (ou espectadores?), estavam com a respiração suspensa, sem acreditar no que viam. E, eu, não tinha nem um pregador de varal para acabar com aquela comédia, que, inevitavelmente, teve um fim, com o cansaço do imprestável, sem dúvida...
                Agasalhei, convenientemente, o pinto gagá, e fui saindo de mansinho. De mansinho, uma ova, estrondou uma salva de palmas e de parabéns dentro daquele banheiro fajuto, como seu fosse um verdadeiro herói...!
                Não me contive, mandei-lhes uma “banana”, levantei minha mão desocupada, com o dedão no rumo daqueles gozadores, e gritei: “taqui pra vocês, bando de felas!” Graças a Deus, mulher e filho não souberam desse causo, senão, nem ao casamento me deixariam ir, piis diriam que o gagá era eu...

                E, ainda, ficam falando do nosso aeroporto... 

segunda-feira, 27 de maio de 2013

Pérola da Tia Corina



Amado Batista (torturador auricular) no programa “De frente com Gabi”:


O músico também comenta que não sabe se agiu certo ao ajudar guerrilheiros durante a Ditadura Militar brasileira. "Eu acho que eu estava errado de estar contra o governo e acobertando pessoas que queriam tomar o país à força". 

quinta-feira, 23 de maio de 2013

ESTÓRIA DE TRANCOSO



Com adaptação de A. J. de O. Monteiro
                Nos meus tempos de criança, as noites de Teresina não ofereciam muita diversão para nós. Uma alternativa era ouvir estórias de trancoso contadas pelos mais velhos. Tive uma tia que era exímia contadora dessas estórias e uma de minhas preferidas era:
DESOBRIGA
                Retornando à sede da paróquia, após cumprir sua primeira desobriga, o jovem padre se depara com um riacho desconhecido e fica receoso de atravessá-lo no lombo do burro, pois não conhecia a profundidade do seu leito. Ficou parado por algum tempo, olhando em volta para ver encontrava alguma maneira de fazer a travessia com segurança quando viu, à distância, um menino, que, de cócoras, a beira do riacho atirava seixos na lâmina d’água para vê-los resvalar uma, duas e até três vezes, formando círculos de pequenas ondas. O padre resolveu ir até onde estava o garoto para ver se conseguia ajuda. Chegando próximo cumprimentou:
                - Boa tarde, meu filho.
                - Boa tarde seu vigário.
            - Me diga pequenino, este riacho é raso? Posso atravessá-lo aqui sem perigo para mim e meu burro?
                - Pode seu padre!
                - Como você sabe?
              - Ora, seu padre, o gado de meu pai atravessa esse riachinho, todo santo dia, de ida e de volta, sem nenhum perigo!
                O padre agradeceu, deu bênção ao pequeno, fincou as esporas nos vazios do burro e caíram n’água. Foram ao fundo, voltaram à tona, foram ao fundo de novo, ambos se debatendo, o padre tendo a batina molhada pesando o triplo do normal e o burro com seus alforges com paramentos do padre e outros instrumentos da liturgia católica estavam quase sem forças, já entregando os pontos quando se agarrou a um cipó e rezando prá todos os santos reuniu suas últimas forças conseguiu chegar à terra firme e puxar o pobre animal que já estava com os olhos esbugalhados.

terça-feira, 21 de maio de 2013

MINHA BALADA



Isaias Coelho Marques

andando nestas ruas,
vai o cantor de rock
que não fui

Sigo andando,
         deixando meus sonhos,
         largando calçados na estrada,
guitarra minada nos ombros,
sons dispersos.

Sigo andando,
sem ser aquele
velho cantor de rock.

Sigo o caminho, 
jogando outros sonhos
pela janela do carro.

segunda-feira, 20 de maio de 2013

SOU DIMENOR






Poncion Rodrigues
              Tô só avisando: Sô dimenor e posso tudo. Se tão pensando que eu tenho medo  de vocês é porque ninguém tá sabendo mermo do que eu e minha galera samo capaz.
                Tá tudo dominado e nóis, com nosso pessoal lá de Brasília e os companhêros dos direitos umano num tamo nem aí prá vocês, seus vagabundo.
                Samos nóis que mata vocês e vocês num pode matar nóis porque é proibido. Vai incarar seus babaca?
                Meu nome é J. P. C. e eu tenho 17 ano de idade e 1 metro e 90 de pessoa e sô uma criança infratora. Eu mato o tanto de gente que eu querer e ninguém  tem nada a ver com isso, por causa de que sô dimenor potregido pelo gunverno. Viu, seu bando de eleitor?
                E tem mais, sô criança infratora e se me  chamar de bandido eu vou contar pro seu juiz. Aquele mesmo que me mandou prá casa da mamãe no mesmo dia que eu matei aquela menina lá na praça, que não quis me dar o velocípedes. Foi ela que pediu. Eu mato mermo. E aí? Eu já disse pros meus companhêros que nossos manos manos lá de Brasília não vai dechar nimguém prender nóis, mas é nunca!
                Vão se f... 

sexta-feira, 10 de maio de 2013


Pérolas da Tia Corina

            O noticiário político é uma verdadeira "mina" de pérolas (mina está entre aspas por sabermos a verdadeira origem da preciosidade). As três a seguir, foram "catadas" ontem. 

O general de brigada do Exército Luiz Eduardo da Rocha Paiva disse nesta quinta-feira (9) que tortura não era crime tipificado na época da ditadura militar no país (1964-1985) e que por isso "ninguém pode ser punido por ele – nem os agentes públicos civis e militares, nem os agentes da esquerda revolucionária". O militar participa de audiência pública na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, em Brasília, sobre o Projeto de Lei 573/11, que altera a Lei da Anistia (6.683/79).
(fonte: UOL Notícias/Política)

“...Ia faltar guilhotina para a Bastilha, para cortar a cabeça de tanta gente que explora esse sofrido povo brasileiro.” (Geraldo Alckmin, Gov. de São Paulo, criticando a impunidade no Brasil)
(fonte: Folha de São Paulo)

"O fio da guilhotina que corta Chico também corta Francisco. Aliados do próprio governo Alckmin não escapariam dessa degola."(DO DEPUTADO MAJOR OLÍMPIO (PDT-SP), sobre declaração de Geraldo Alckmin de que muita gente perderia a cabeça se o povo soubesse o que acontece.)
(fonte: PAINEL/Folha de São Paulo)

segunda-feira, 6 de maio de 2013


Pérolas da Tia Corina

A. J. de O. Monteiro
                Quando resolvi criar um blog para preencher o tempo ocioso resultante da aposentadoria, a ideia inicial foi abrir um espaço para publicar crônicas, artigos, contos e poesias. Trabalhos meus e de alguns amigos que se prontificaram ajudar-me nessa empreitada.
                Entretanto, num domingo desses, envolvido por vapores alcoólicos, tive outra ideia (vou terminar aprendendo pensar): Criar uma seção no blog um pouco afastada do propósito inicial. Uma seção chamada “Pérolas da Tia Corina”, com o objetivo de publicar frases e/ou declarações lidas, ouvidas ou imaginadas por quem quer que seja... Importando, apenas, que tenham conteúdo interessante (hilárias ou sérias, inteligentes ou estúpidas).
                Espero contar com a colaboração de todos os que gostam do blog e publico a seguir a primeira pérola como exemplo daquilo que imagino:
                “Todo mundo é bipolar. A questão é que uns estão ligados em 110v e outros em 220v.” 

quarta-feira, 1 de maio de 2013

CAXI O QUÊ?





A. J. de O. Monteiro

O estado da Bahia é prodigo em dar à luz gente diferenciada nos vários campos das manifestações intelectuais: artes plásticas, literatura (prosa e poesia), música, teatro, enfim, em todas vertentes intelectuais. Nas artes plásticas pontifica Iberê Camargo, na literatura Jorge Amado alcançou à condição de ícone internacional, na boa música, então, a boa terra presenteou o Brasil com compositores e cantores do nível de Caetano, Gil, Raul Seixas, Betânia e Gal, para citar uns poucos, entre tantos.
                A questão é que, na mesma proporção que produz qualidade, a terra de Castro Alves também produz gente bizarra e bizarrices de toda ordem,  como a tal “axé music” que agrediu a MPB com pérolas do nível das abomináveis “segura o tchan”, “na boquinha da garrafa” e “água mineral.” A cada carnaval um (às vezes mais de um) ritmo novo, acompanhado de uma coreografia que se situa entre a bizarrice e a pornografia é lançado e inunda o Brasil através dos meios de comunicação. Todos ganham com produto barato, ruim e passageiro. Menos a boa arte que cada dia mais é afastada do povo.
                E ganham muito dinheiro com isso!
                Agora, aproveitando os próximos eventos futebolísticos (que termo!), a figura mais bizarra entre as tantas que a boa terra já produziu e que nos carnavais se fantasia de figuras imprecisas misturando características de várias culturas (africana, hindu e ameríndia) numa verdadeira mixórdia com turbantes, ou cocares, colares, saiotes de penas e outros adereços espalhafatosos, lança, com todas as pompas e circunstâncias a CAXIROLA: Instrumento de fazer barulho, com o qual pretende ocupar o espaço das terríveis “vuvuzelas” sul-africanas que tanto nos incomodava, mesmo aqui, do outro lado do mundo.
                Se o instrumento é bizarro, o nome – caxirola – é tanto ou mais ridículo que aquele escolhido para o nosso simpático tatu-bola, eleito símbolo da copa, que, até mesmo por estar ameaçado e extinção, merecia mais respeito. O nome FULECO, dizem ser uma aglutinação de futebol + ecologia. Será então CAXIROLA a aglutinação de caxixi + rola? (ainda se usa o circunflexo?).
                No jogo de reinauguração do estádio Fonte Nova entre os times Bahia e Vitória, a torcida do tricolor baiano, irritada com a derrota no clássico, fez chover caxirolas no gramado, gesto que provocou irada reação do jornalista Thadeu Revólver. O rapaz chamou os torcedores de mal educados e, pasmem, disse que o instrumento deveria ser tratado como orgulho nacional!, pasmem! Tal reação me fez pensar: qual o interesse que o jornalista ou a empresa que o paga têm no tal instrumento? O certo é que a emissora do “plim-plim” já exibiu a tal caxirola em seus noticiários e programas de variedades, por diversas vezes.
                Tudo bem que o cara queira ganhar dinheiro vendendo sua invenção à torcida entorpecida pelo ufanismo que o futebol desperta, tudo bem! Tudo bem que uma emissora de televisão ou quaisquer outro meio de comunicação queiram entrar no baile e lucrar com isso, tudo bem, também! O que não fica nada bem é a Presidente da República, acompanhada do bizarro “inventor”, aparecer na televisão chacoalhando a bizarra “invenção” e chacoalhando também a dignidade do cargo que ocupa, deixando estupefata parte da sociedade que ainda tem algum senso do ridículo.
                E viva o povo brasileiro, os seus inventores e suas invencionices

TESO DURO



Manoel Emílio Burlamaqui de Oliveira
            
                  Monteiro Lobato e J. M. Barrie, como gênios da lâmpada, imaginaram e criaram paraísos para nós, crianças e jovens, que tiveram a ventura (e a aventura) de compartilhar com as personagens do Sítio do Pica-Pau Amarelo e da Terra do Nunca, onde o amor, a bondade, a curiosidade, o saber, sempre foram acompanhantes de D. Benta, Tia Nastácia, Pedrinho, Narizinho, Emília, Visconde, Quindim, Burro Falante, Rabicó, e de Peter Pan, Wendy e seus irmãos, fada Sininho, os Meninos Perdidos e, até o capitão Gancho, com seus piratas e o indefectível crocodilo! Lembro-me da luta de Gancho com Peter Pan, quando aquele pergunta a Peter, antes de ser derrotado, quem era ele e obtém a resposta: “eu sou a juventude!”.
                Pois bem, eu, também, tive meu sítio do pica-pau amarelo, a minha terra do nunca, onde a juventude morava, o Sítio do Teso Duro!
                Sou todo saudade, ao evocar minha avó Preta e meu avô Manoel Carlos, minha Tia Santa (Lormina) e meu tio Vaz (Joaquim Vaz da Costa), meus primos e primas, Dandosinha (Maria), Beta (Albertina), Primo, Rui, Clotilde, Lormina, que já não estão mais conosco, e, mais, o Cloves e o João Pessoa, que residem, hoje, em Belo Horizonte e Recife, e, ainda Tio Humberto e seus filhos, a prima Emiliana, com seus filhos Regina e Edmundo, a Dedé, que morava com meus avós, até seu casamento com o primo Celestino, que também já nos deixaram... O Carrão (xará de meu pai Carlos) e seu filho Newton, também nossos primos... E mais quantas personagens, que precisaria de outro livro e de uma memória menos fraca para nomeá-las...
Pessoas que só pensavam em fazer o bem, em ajudar os outros, que viviam a vida alegremente, levando essa alegria de viver ao que lhes rodeavam... Ah! anos 40... Brincadeiras de roda (fogo apagou, anel, histórias e cantigas, e tantas outras que fogem á lembrança) em que crianças menores, filhos da Dandozinha se misturavam conosco, que virávamos crianças, também...
Jogos de baralho, à luz de lamparinas, com meus avós e o Edmundo, meu par preferido do jogo de bisca, também conhecido como sueca. Discussões, brigas, gozações, jogássemos errado ou certo, que terminavam em gostosas risadas. E, depois, rede, onde dormia, sonhando sonhos os mais gostosos, que até ficava com raiva quando acordava...
E dizem que o passado não volta... Nem é preciso, pois se encontra, vivo, em mim!
(do livro De Corpo Inteiro)

ÚLTIMO ROUND



Isaias Coelho Marques

Nos consome
os veios escorridos
para além do tempo

O tempo
Sempre o tempo
A nos golpear
Pacientemente
Até o nocaute final