domingo, 29 de junho de 2014

ESPERA



Isaias Coelho Marques

Em cada esquina minha,
Deixei, esperando-a, beijos meus.
Nas ruas de minha solidão,
Trafegava, único, seu coração.
Fui enchendo rios de espera...
Faltou-me o chão do absoluto
Mesmo assim resisti, resoluto.

Eis que um dia,
Sem mais nem menos,
Ei-la derramando luz... 

domingo, 22 de junho de 2014

MERCADO

Karl Marx


Isaias Coelho Marques.

Melhor da vida
Ver minha  arte
Consumida

HISTÓRIAS TRANCAFIADAS*




Daniel Cariello**
                Quando se fecha uma biblioteca, finda-se o acesso a novos universos, a outras culturas, a diferentes línguas, a desconhecidas linguagens. Ficamos mais burros e mais ignorantes sem nem mesmo perceber.
                Quando se fecha uma biblioteca, ausentam-se livros que ansiavam por redenção, à espera de que um estudante, um pesquisador ou um curioso desvende seus segredos, revelados lentamente no passar das palavras e das páginas.
                Quando se fecha uma biblioteca, veda-se às crianças aquele instante mágico e único da descoberta de uma obra que vai acompanhá-las a vida inteira. De uma aventura impossível ou de uma fantasia espetacular, que elas podem viver por alguns momentos graças às letras e aos desenhos impressos em folhas antes brancas, da qual se recordarão suspirando fundo, com uma mistura de nostalgia e felicidade, quando ficarem mais velhas e mais sérias.
                Quando se fecha uma biblioteca, sinaliza-se para o mundo que a praticidade deseja subjugar a fantasia, o desleixo pretende superar o cuidado, a barbárie tenciona sufocar a delicadeza.
                Quando se fecha uma biblioteca e se pendura na frente um pequeno papel escrito “interditada”, impede-se o nosso contato com uma parte de nós mesmos que talvez nem conheçamos ainda. Com um pedaço de nossa alma aguardando ser despertado por uma obra adormecida em uma estante, que pode nos tocar bela e profundamente, a ponto de nos mudar para sempre.
                Quando se fecha uma biblioteca, calam-se heróis e vilões, gentis e canalhas, campeões e derrotados. Findam-se récitas e aventuras, tragédias e farsas. Matam-se autores e leitores.
                Quando se fecha uma biblioteca, e não importam os motivos ou os culpados, trancamo-nos mais em nós mesmos, em nossa individualidade, em nosso egoísmo.
                No momento em que nos descuidamos e permitimos que uma biblioteca seja aferrolhada com todos os livros do lado de dentro e os leitores do lado de fora, ficamos em débito impagável com nosso próprio passado e nossos antecessores, mas, principalmente, com nossa continuidade e com aqueles que estarão por aí quando já tivermos partido.
                Quando se fecha uma biblioteca, principalmente se ela faz parte de nossa vida e da história do lugar em que moramos, é hora de abrirmos os olhos para ver bem o que estão fazendo de nossa cidade. E a boca para dizer que não aceitamos isso.
*Originalmente publicado em Veja Brasília de 04/06/2014.
**Leia também as crônicas de Paris, escrita pelo mesmo autor, no livro Chéri à Pariswww.cheriaparis.com.br


quinta-feira, 19 de junho de 2014

OS PARENTES ESTÃO CHEGANDO*




A. J. de O. Monteiro
                Em dia de inigualável felicidade recebi as chaves de um belíssimo apartamento, situado em área nobre do Plano Piloto/Brasília.  Como era moda na época para pisos de taco, mandei passar sinteko¹. Sem pressa comecei mobiliá-lo condizentemente, seguindo sempre as sugestões de minha futura esposa. Ficou muito bonito e, ao mesmo tempo, funcional. Uma beleza, mesmo!
                Tão feliz quanto no dia em que recebi as chaves do apartamento, casei! Cerimonia simples, com poucos amigos e alguns parentes, pois as reservas pecuniárias foram quase que totalmente consumidas com o preparo do ninho de amor. Tudo me parecia flores! A lua-de-mel, suave e gostosa com aquele “cheirinho de terra molhada das primeiras chuvas do mês de janeiro”. Era só felicidade! A atrapalhar apenas a presença de meu irmão que morava comigo e ainda não havia encontrado um canto para morar como ficara acertado. Desorganizado, preguiçoso, confortista... Sua presença, ao tempo que atrapalhava, deixava inquieta minha mulher.
                Um dia, outro belíssimo dia, ele conseguiu mudar-se. Pensei, aliviado, “enfim sós”! Oh não! A mãe dela chegou...
                Passada a fase em que (eu supunha) tudo eram flores, descobri que nos nossos (principalmente nos meus) caminhos começaram aparecer espinhos. Os parentes (os dela), inúmeros e espalhados por todo o Goiás, quiçá alhures, começaram a chegar. Primeiro um, o Ciniro, sob o pretexto de conseguir emprego na capital. Recebi-o com o sorriso e a alegria de uma tia velha que recebe a visita de seu sobrinho favorito. Principalmente porque naqueles tempos, Brasília ainda ofertava muitas oportunidades de emprego o que deixava a expectativa de que logo ele se empregasse e tomasse seu rumo.
                De repente, não mais que de repente, o sorriso fez-se pranto e o pranto dor²...  Chegou mais um... Depois outro e mais outro. Aquele apartamento que imaginara o meu “lar doce lar” tomava feição de hotel de cidade do interior em dias de festa de santa padroeira. À noite colchões eram espalhados pelos quartos, inclusive o de serviço e, ás vezes, até na sala e sacadas. Tinha goianos por todos os lados e goianas por todos os cantos. Cada palmo do apartamento era disputado a unhas e dentes. De minuto em minuto as descargas dos sanitários eram acionadas... Os da suíte conjugal, inclusive! Nas portas dos sanitários uma fila a lembrar novamente uma quermesse do interior. Em momentos aflitivos de prementes necessidades, cheguei a recorrer a sanitários de bares próximos. À mesa quase sempre arroz com pequi e galinha caipira com guariroba³ - que eu gosto, mas já beirava exagero. Certa vez, com ironia, propus um leilão e eles toparam...
                Pela manhã, preparando-me para trabalhar:
                ­- Mulheeer, cadê minha gravata “bordô”?
                - Ah, o Ciniro usou como atadura...
                - Como?
              - É, o Calixto, numa discussãozinha, jogou o cinzeiro de porcelana na cabeça dele... Fez um rombo enorme, como não tinha atadura, emergencialmente, usei a gravata...
                - E o cinzeiro?
                - Quebrou, mas ele, o Calixto, prometeu colar e a gravata já coloquei de molho...       
               E assim por diante: O barbeador sempre entupido de pelos... A loção pós-barba fora usada como desodorante... Meu cigarro desaparece na fumaça de mil fábricas de Cubatão... Minha cachaça Mangueira trazida do Piauí é consumida como água. Meu sossego, minha paz... Estão acabando com tudo... Os parentes chegam e não saem mais...
*Texto escrito em 1977, em Brasília/DF.
¹ Produto que se aplicava aos pisos de madeira para dar-lhes mais beleza.
² Inspirado em versos de Vinicius de Moraes.
³ Palmito amargo extraído de palmeira do cerrado goiano.

quinta-feira, 12 de junho de 2014

CHEIRO



Isaias Coelho Marques

Jasmim
sem aroma
morto ressequido

Jasmim
teu aroma
saído das esquinas
(insuportavelmente vivo)
acompanha meu ser
pequeno compacto robusto

Necessário jasmim
insubstituível
como os frutos secretos

segunda-feira, 9 de junho de 2014

ABERTURA AO (SUB) DESENVOLVIMENTO – VI





Manoel Emílio Burlamaqui de Oliveira

Crescimento econômico (custos e benefícios)
                O progresso do conhecimento humano, a partir da idade da pedra (era paleolítica), com a feitura armas de pedras aguçadas, para defesa e para a obtenção de alimentos do homem primitivo, tornou a nossa história das invenções e das descobertas uma maravilhosa viagem, através do tempo, ao nos encontrarmos com o fogo, com a roda, com o arado, com a escrita, com os algarismos, com o calendário, ou com a luneta, o telescópio, com o relógio, com as caravelas, as máquinas e o barco a vapor, o prelo, a imprensa, a luz elétrica, o telefone sem fio, o telégrafo, o balão e o avião, com a aspirina e a penicilina, e com outros milhares de frutos da criatividade e da pesquisa humanas. Cumpre, aqui, uma primeira observação: invenções e descobertas beneficiaram a todas as nações e todos os homens, ou somente aos donos do poder e das riquezas? E o seu uso, teria sido, apenas para o bem? Vejamos o verso da moeda: guerras, invasões, extermínios de povos e culturas, genocídios, rapinas, dominação, servidão, escravidão, fome, lutas fraticidas, etc., etc.,, nos dizem que o crescimento econômico, o progresso, não se transformou em desenvolvimento, isto é, não foi utilizado para tal. E, muitas dessas descobertas e invenções serviram, também, a essa face da moeda, a exemplo das caravelas, da pólvora, dos armamentos, da bomba atômica! Não será tarefa nossa, nesse momento, avaliar esse tipo de crescimento, pois teríamos que recorrer a princípios morais e éticos. Aliás, o horror das conquistas, o horror das dominações, o horror da exploração humana, já teve um defensor, o pai do pragmatismo, que justificava os meios para alcançar os fins: Maquiavel, filósofo, político, historiador e escritor notável do século XV. A História, como o Passado, é imutável. Mas, erros, cometidos ontem, podem ser evitados, hoje e no futuro. Desenvolvimento é correção de erros, é pesquisa e elaboração de novos caminhos, é crescimento humano. É um processo que não admite escolhidos e abandonados, pois é do homem, de todos os homens.
(continua)

NÓS NA CABEÇA*




Daniel Cariello**
                
                   Venho, por meio desta, protestar contra o fim de um dos mais importantes ritos de passagem da infância. Uma prova de habilidade e paciência que foi posta para escanteio em nome da praticidade e da velocidade destes nossos dias.
                Falo daquele momento mágico, por volta dos 4 ou 5 anos de idade, no qual aprendíamos a amarrar sozinhos o cadarço dos tênis. Algo que está sendo limado da vida de nossos meninos à medida que a antiga arte de atar um cordão vem sendo substituída pelo monótono e simplório abrir e fechar de um velcro.
                Lembro-me da primeira vez que fui bem-sucedido na tarefa, com meu calçado Bamba azul surrado. Aconteceu durante o recreio de um dia chuvoso do 1º jardim. Sem possibilidade de sairmos da sala e com a guerra de massinhas voadoras definitivamente banida pela tia Floriza, só nos restou ocupar o tempo treinando laços. O Alex foi o primeiro a conseguir, seguido do Marcelo e de mim.
                Naquele instante, senti-me um super-herói. Depois de ser capaz de cuidar dos meus cadarços, acreditava-me apto a qualquer desafio mais simples, como pular do telhado da escola dando piruetas. Chamei o Alex para me acompanhar nessa nova aventura, mas a tia Floriza disse para a gente ficar bem quietinho ali e parar de inventar moda. Tudo bem, eu estava mesmo tão empolgado com a descoberta de uma nova competência que continuei treinando e saí fazendo um laço em cima do outro. Depois, tive de passar a tesoura e cortar tudo, pois não havia quem desatasse aquele nó cego.
                Voltando ao velcro, eu o considero um dos símbolos destes tempos em que os infantes estão perdendo contato com atividades que desenvolvem a inteligência e as habilidades psicomotoras. Amarrar o cadarço é apenas um exemplo, mas a lista ainda contém outras, como soltar pipa ou rodar pião.
                A fim de comprovar minha teoria, outro dia pedi a uma menina para dar um laço no cordão de um tênis, e ela não conseguiu. Desolado, decidi fazer um filme para mostrar a outras pessoas e levantar uma discussão sobre os rumos da infância nos dias atuais. Enquanto ela se enrolava com o longo fio, peguei meu smartphone e abri o novo aplicativo de vídeo que tinha acabado de baixar. Cliquei em um ícone, pressionei outro, tirei uma selfie minha sem querer, mas não houve jeito de registrar o momento.
                Irritada, a criança se levantou e pegou o telefone da minha mão. Tentei tomar o aparelho de volta, mas, antes de conseguir reagir, ela fez um filme meu, aplicou um efeito, incluiu uma trilha sonora e o enviou a todos os contatos da minha agenda.
                O pior nem foi isso. O pior foi que, nessa ocasião, ela bateu meu recorde no Angry Birds. Já faz uma semana que tento, mas não consigo superar a marca da menina.
*Originalmente publicado em Veja Brasília de 04/06/2014.
**Leia também as crônicas de Paris, escrita pelo mesmo autor, no livro Chéri à Paris www.cheriaparis.com.br

quinta-feira, 5 de junho de 2014

O CIO

Foto de w.caozinho.com.br/yorkshire


Manoel Emílio Burlamaqui de Oliveira
                     
                    Tenho uma cadela, bonitinha, que me acompanha, em minhas caminhadas, forçando-me a fazer esteira, pois, mais puxa que acompanha. Ontem, desconfiei que a Garota esteja entrando no cio, pelos cachorros que nos acompanharam, e não por minha formosura ou delicadeza, naturalmente. Fiquei, até, encabulado, quando outros colegas da madrugada me viam na frente daquela fila!
                    Disse, comigo mesmo, amanhã, ela me paga...
              Hoje, 05h30min, lá estava a Garota, esperando-me para receber a coleira, e sair para a caminhada, numa animação que só vendo... Vai é nada, safadinha, pensa que esqueci os acontecidos? Saí só.
                  Só? Uma ova, na rua já se encontravam uns três bandidos, latindo pra mim, sem agressividade, o que entendi por indagações sobre a coleguinha deles. Claro, respondi-lhes que estava de castigo e a culpa era deles...
                Pra que, as delicadezas se foram e começou o xingamento, em altos e ameaçadores latidos... Corri, para entrar em casa e, agora, estou com medo! O que fazer?
               Ajudem-me meus amigos e amigas, devotos de São Francisco, pois tenho que caminhar, por conselho dos médicos, não quero perder a companhia da Garota (ela, também, necessita de exercícios) e nem ganhar a inimizade dos filhos de cadela, que abundam no meu bairro!
                S O C O R R O !

quarta-feira, 4 de junho de 2014

ABERTURA AO (SUB) DESENVOLVIMENTO – V



Manoel Emílio Burlamaqui de Oliveira

Crescimento econômico ( custos e benefícios)
                Não se discute sobre a necessidade de recursos financeiros para o desenvolvimento. Entretanto, são discutíveis as maneiras de obtenção de tais recursos. Apelemos para o raciocínio: um bem material não cresce, uma cadeira será, sempre, uma cadeira. Mas, uma cadeira pode ser trocada por outro bem, (outra cadeira, por exemplo, mais nova, mais confortável, maior, menor), dependendo do seu valor e preço. E, aí, surge o mercado de trocas, de compras e vendas, que, dependendo de onde se encontram compradores e vendedores, ou trocadores, demanda e oferta, é denominado, atualmente, de local, nacional ou interno, internacional ou externo. Quando a demanda, ou procura, é maior que a oferta, o preço do bem aumenta. Quando os compradores são poucos, para a quantidade de bens ofertados, esse preço cai, decresce. Quando são bens cuja produção pode ser aumentada (agrícola, artesanal, industrial,) oferta e demanda se equilibram, entretanto, é bom lembrar, todos os bens têm um custo para quem o possua ou queira possui-lo. Para o produtor, vender um bem abaixo do seu custo é ter prejuízo, isto é, diminuir sua riqueza. Mais há bens, ou produtos, cuja matéria prima existe em abundância e/ou pode ser produzida pelo homem, como a vegetal, e a animal. Porém, a mineral é escassa e não se multiplica, ao contrário, pode esgotar-se, se seu consumo não for racionalizado, como a agua, o solo, o petróleo, o ouro, etc, etc. Uns, abundantes, torna-se fácil a sua aquisição; outros, escassos, à medida que se esgotam, criam problemas, até para a sobrevivência humana.
                 E, para concluir essa ligeira digressão, sem aprofundar o assunto, matéria com discussões infinitas para os estudiosos, principalmente, para os economistas, não esqueçamos de que outro fator, fundamental, para que exista a produção, o produto, o bem. produzido, ou extraído da natureza, é a chamada mão-de-obra: O homem. O crescimento econômico é essencial para o desenvolvimento. E ele tem acontecido a olho visto. Não será exagero, porém, afirmar-se que tem sido obtido através das guerras de conquista dos fatores de produção, dos mercados, do poder, da dominação, de regiões e de povos. A alcunhada “economia de mercado”, também conhecida como capitalismo, à medida que amadurece e se solidifica, estabelece leis que, se não forem seguidas, os seus objetos, vendedores e compradores, se darão mal... Dentre tais leis, emerge a dos custos e benefícios para que se compare e avalie o esforço feito para a produção, ou a aquisição do bem, face à sua necessidade e sua satisfação... Assim, se considerarmos o crescimento econômico, conhecido, igualmente, como progresso humano, um bem para os povos, deveríamos medir seus custos e benefícios, isto é, o que se gastou e o que foi ganho com o processo de sua obtenção, com as guerras de dominação e com as aspirações da humanidade. E, também, se não haveria outras opções, sem a crueldade e a (des)humanidade dos métodos utilizados para a obtenção desse progresso.
(Continua)

RÉGIO, PONTES E VERDADE EM VERSOS




(*) Ferrer Freitas

             José Régio é o pseudônimo literário do português José Maria dos Reis Pereira, que nasceu em 1901 em Vila do Conde, onde veio a falecer em 1969.  A cidade integra a grande região metropolitana do Porto. Licenciado em letras em Coimbra, lecionou por mais de 30 anos e foi um dos fundadores da revista de nome “Presença”, que, não sei se por coincidência ou homenagem, é o mesmo da editada pelo nosso Conselho Estadual de Cultura. Romancista, dramaturgo, ensaísta, foi no entanto como poeta que se notabilizou. Com o livro “Poemas de Deus e do Diabo”, editado em 1925, apresentou a maioria dos temas que viria desenvolver.
               Redescobri o poeta português pela lembrança que me veio, de inóspito, do belíssimo musical “Brasileiro, Profissão Esperança”, de Paulo Pontes (Vicente de Paula Holanda Pontes), paraibano de Campina Grande, nascido em 1940 e falecido no Rio em 1976, desaparecimento extremamente lamentado nos meios teatrais por se tratar de jovem dramaturgo de peças de enorme sucesso, como foi o caso de “Um edifício chamado 200”. Para a televisão escreveu a série “A grande família”, de não menos sucesso. Registre-se que tudo isso ocorreu de meados dos anos 60 até seu falecimento em 1976, com apenas 36 anos.
               “Brasileiro, Profissão Esperança” retrata as vidas atormentadas do pernambucano Antônio Maria, jornalista, radialista e letrista de memoráveis sambas-canções, entre os quais o belíssimo “Ninguém me Ama”, em parceria com Fernando Lobo, e da compositora e cantora Dolores Duran, autora de sucessos como “Estrada do Sol”, composto em parceria com Tom Jobim. A montagem no Canecão, em 1974, com Clara Nunes e Paulo Gracindo, sob a direção de Bibi Ferreira, foi de tal modo festejada, que virou disco “long-play” e, posteriormente, CD. De texto antológico, permito-me transcrever aqui o poema “Cântico Negro”, de José Régio, magistralmente recitado no show por Paulo Gracindo.  E o faço por que contém verdades incontestáveis que merecem reflexões de muitas pessoas:

terça-feira, 3 de junho de 2014

domingo, 1 de junho de 2014

UM DIA NA VIDA DE UM HIPOCONDRÍACO.



A. J. de O. Monteiro
                Quinta feira, 29/05/2014, 05:00 horas.
                Ai! Acordei. Doem-me as costas, a boca amargando e a cabeça prestes a explodir. Tateio pelo criado mudo até encontrar a cartela de “BOMFLEX”, meu primeiro e imprescindível remédio do dia. Tomo dois comprimidos e espero alguns minutos pelo resultado, que geralmente não tarda muito. Enquanto isso, ao meu lado e alheia as minhas agruras a velha companheira na saúde e na doença, ronca solenemente. Passo então aos exercícios de alongamento: Os primeiros, ainda na horizontal, para pernas e coluna lombar. Em seguida, já na vertical, a bateria para braços, abdômen e colunas torácica e cervical. Isso tudo, remédio e alongamentos, me manterá ereto até à tarde quando farei fisioterapia, hidroterapia, pilates e acupuntura.
                Vou ao banheiro para as obrigações fisiológicas matinais e toalete completa. Em seguida consulto a agenda do dia: 06:00 horas, laboratório levar material para exames parasitológicos de fezes e urina (EAS e cultura) e coletar sangue para os exames hematológicos (hemograma completo, glicemia de jejum, glicemia glicada, colesterol total e frações, LDL, LHL, VLDL, T3, T4 livre, TSH, potássio, vitamina D, TGO, TGP, sorologia, PCR e PSA); 08:30 horas, consulta com o gastroenterologista; 11:30, horas consulta com o nefrologista; 14:30 horas, novamente ao laboratório coletar sangue para a glicemia pós prandial; 15:00 horas início das sessões de fisioterapia, hidroterapia, pilates e acupuntura. Na agenda também estão anotados os remédios que tomo diariamente para manter-me minimamente vivo e ativo. Para evitar atropelos também programo o alarme do celular. Sem essas precauções, estaria morrendo aos poucos em cima de uma cama fustigado por dores lancinantes (basta esquecer um só remédio que o castigo vem de imediato).
                Depois do laboratório, volto pra casa, faço um frugal desjejum e vou checar o estoque de medicamentos pois tenho que mantê-lo em nível de segurança. Não posso arriscar-me a ficar sem qualquer um deles, por um dia sequer. Isso feito, vendo que o cronograma me dá uma boa folga até a hora da consulta com o gastro, vou a “minha” farmácia comprar aqueles medicamentos que dispensam receituário médico. Na farmácia o atendente que já conhece meus remédios vem logo me atender. É um excelente profissional! Além de me atender com presteza está sempre atualizado com os lançamentos da indústria farmacêutica e me informa daqueles mais eficazes no combate aos meus males. Ele conhece todos os meus problemas de saúde e diz que aprendeu muito de literatura médica comigo.
                Da farmácia, já abastecido e, portanto, mais tranquilo, sigo para o consultório do gastro. São 07:30 horas, o que me dá 30 minutos para chegar na hora agendada.
                O consultório fica no centro e é horário de “rush”. O trânsito está infernal.  Ainda perco algum tempo procurando vaga até que encontro uma, bem apertada e que exige muita paciência e habilidade para encaixar o carro. Quando consigo estacionar, logo aparece o dono da vaga que comunica taxativamente: “Vou vigiar seu carro, Doutor”...