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Império persa |
Encaminhado por Manoel Andante
(Texto¹ inicial, retirado de uma
conferência pronunciada pelo Des. Joaquim Vaz da Costa², em 1924, quando Juiz
de Direito de S. João do Piauí, em benefício do "Patronato Agrícola"
de S. Raimundo Nonato, dirigido pelo Pe. Horácio R. De Moraes, Sob o título de
"A Escravidão na República" e publicada em seu livro "Arengas e
Retalhos", 1924).
"Ao
principiar este espectro de conferência, vejo estampar-se, em vossos semblantes
um misto de admiração e de assombro, ao ouvirdes falar em escravidão, depois de
34 anos de República, e quando ainda nos chegam aos ouvidos as últimas
vibrações dos hymnos e soam clangorosos os échos das trombetas que fizeram
estremecer, de enthusiasmo e de alegria, o mais esquecido recanto de nossa
querida Pátria, ante o primeiro centenário de nossa independência política.
Se,
entretanto, lançardes um olhar, não simplesmente contemplativo, porém, arguto e
pers- crutador, das matas sombrias do Amazonas às verdejantes campinas do sul;
do adormecimento de réptil dos Estados do Norte, atrasados e inertes, ao
progresso estonteante e vertiginoso de S. Paulo admirável, conversar-vos-eis de
que todo esse nababo, portentoso de esbanjamentos e de riquezas incalculáveis,
não passa de uma grande senzala onde se move a massa immensa de milhões de
escravos da ignorância e do analphabetismo, e milhões de letrados, escravos das
conveniências mesquinhas, escravos dos interesses inconfessáveis, escravos da
falta de sentimento do dever, escravos da miséria moral, finalmente...
A
nação às portas da bancarrota; os Estados entregues a uma politicalha baixa de
cobras que comem cobras; os município, eternas satrapias, sem responsabilidades
e sem escrúpulos perante os munícipes, mas, em compensação, sem independência e
sem autonomia perante os Estados; os governantes preocupados com a satisfação
exclusiva das conveniências individuais, em detrimento dos interesses do país,
dos Estados e dos municípios; o legislativo fiel aos gestos, à vontade e aos
caprichos do executivo; a justiça acanalhada, sem confiança, sem independência
e sem autonomia, ou perseguida e desautorada, sem acatamento e sem garantias;
os políticos, banais, sem ideal, sem programma, sem decoro e sem convicção; o
correio e o telégrapho, sem sigilo e sem compostura; a imprensa amordaçada; a
alma do povo “minada por um pessimismo canceroso e corrosivo"; eis o
quadro horrível da horrenda escravidão que todos nós temos, na República, o
dever de procurar combater, por todos os meios e com todas as forças a fim
deque tenhamos, no mais próximo futuro, o gozo de ver essa immensa senzala
transformada em nação livre, pujante, forte e grandiosa".
¹ Mantida a grafia original.
² Vaz da Costa, o tio Vaz, era
irmão de minha avó Salustiana e primo de meu avô Manoel Carlos de Oliveira.
Tive a felicidade de conviver com minha família paterna, durante os anos
1946/51, quando residi com meu avô, na "Terra Dura”. Propriedade de tio
Vaz, enquanto fazia o curso cientifico, no Liceu e o 1º ano de Direito, na
nossa Salamanca. Meu tio era professor de Introdução à Ciência do Direito e foi
um dos criadores e fundadores daquela Faculdade. Muita saudade de todos,
incluindo os primos de todos os graus! (Manoel Emílio Burlamaqui de Oliveira)