A. J. de O.
Monteiro
Vivi minhas
infância e adolescência, nas décadas de 50 e 60, ali nas cercanias do Liceu
Piauiense, Mercado Velho, Fiação e Baixa da Égua. Nesses sítios da provinciana
e pacata Teresina daqueles tempos curti (não havia essa gíria) divertida
despreocupadamente o possível da vida que transcorria no ritmo alternado de
aulas e férias.
Havia, então,
um elemento essencial à vida urbana: As calçadas. Uma instituição que se
constituía num dos mais importantes
meios de interação social, ao lado das igrejas, clubes e praças . As calçadas
não eram apenas vias de trânsito de pedestres, nelas jogava-se futebol de dois
(quem daquela geração não lembra?), espiava-se
a vizinhança, tomava-se banho de chuva aproveitando o jorro d’água que caia
forte das bicas (bocas de jacarés) das antigas casas. Lembro-me dos alertas dos
mais velhos para evitar-se o banho nas primeiras chuvas que escorriam toda a
sujeira acumulada nos telhados durante o verão.
No centro da
cidade concentrava-se o grande comércio, a maioria das repartições públicas, os
cinemas, as poucas agências bancárias e o clube dos diários, hoje transformado
em centro cultural. Pelas calçadas do centro via-se senhores de paletó de linho
e chapéu de massa, senhoras e senhoritas fazendo compras nos magazines ou
simplesmente desfilando modas. Rodas se formavam à sombra dos frondosos
oitizeiros para discutir política, futebol ou pilheriar. Todos se encontravam
pelas calçadas. A cidade pequena permitia que seu centro se transformasse num
grande ponto de encontro.
Mas era à
noite que as calçadas assumiam sua principal função social. Nelas, logo após o
jantar, as famílias sentavam em rodas para comentar os acontecimentos do dia, receber
visitas para um cafezinho acompanhado de um bolo caseiro ou, simplesmente, para
admirar a beleza do firmamento estrelado e ainda não corrompido pela iluminação
artificial. As crianças e os jovens normalmente ficavam a parte das rodas
adultas, sentavam-se nas equinas ao redor de um poste do IAEE (Instituto de
Água e Energia Elétrica) que fornecia uma fraquíssima iluminação de lâmpada
incandescente e ainda não quebrada por algum casal de namorados em busca da cumplicidade
da noite sem luar. E por ali ficavam até ouvirem a ordem: Já prá cama, amanhã é
dia de aula...
Fiz essa
pequena retrospectiva nostálgica apenas como introito do verdadeiro tema que
quero abordar: AS CALÇADAS DE TERESINA, HOJE.
É com grande
tristeza e indignação que olho as calçadas de Teresina hoje. Esse patrimônio da
população, principalmente dos pedestres (e todos nós somos pedestres). Além de
mal cuidado está sendo despudoradamente privatizado, transformado em
estacionamento de clínicas, escritórios e estabelecimentos comerciais de toda
natureza. No centro antigo algumas lojas já expõem suas mercadorias nas
calçadas: colchões, aparelhos de som, geladeiras, fogões e móveis em geral, é
como se Teresina não dispusesse de um Código de Postura Municipal. E por falar
nisso, onde está a Prefeitura que não age contra esses abusos? Autoridade prá
isso tem! O que não tem é compromisso com a cidade.
No trajeto
de minhas caminhadas diárias enfrento diversos obstáculos: carros estacionados
sobre as calçadas, buracos, desnivelamento do piso, entulhos em geral, bares e
lanchonetes que espalham mesas e cadeiras sem deixar espaço para os transeuntes
e, pasmem, uma armadilha. Sim, uma armadilha! No
cruzamento da Rua Visconde da Parnaíba com a Rua Honório Parentes, no Horto
Florestal, existe um condomínio (um imponente edifício de apartamentos) cujo
portão que dá acesso à garagem se abre verticalmente feito joelho de
galináceos. Quando acionado, o tal portão projeta sua lâmina inferior para a
calçada podendo, ocasionalmente (não sei se isso já ocorreu), atingir alguém
que esteja passando pelo local. Se for uma criança ou um idoso, pode causar um
acidente grave. Fico a imaginar: O iluminado que instalou aquilo certamente
raciocinou com a região glútea.
Estou
pensando seriamente em fazer um curso de “Le parkour” para enfrentar essa
aventura diária que é caminhar pelas calçadas de Teresina.
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