Daniel Cariello**
— Pedro, onde está o sujeito da
frase “Enquanto os assaltantes arrombavam o banco, Nicolas tomava um suco na
esquina”?
A pergunta pegou Pedro de
surpresa. Do fundão, fixou os olhos na sentença escrita no quadro. Examinou
cada palavra, coçou a cabeça, desviou o olhar, segurou o queixo e voltou a
atenção para a lousa. Permaneceu semicatatônico por longos segundos. Depois, cheio
de certeza, levantou-se, encheu o peito e soltou o veredicto.
— Não faço ideia de onde ele
esteja.
— Então, é zero!
— Mas sei para onde deveria ter
ido.
A professora já tinha vivido
quase todo tipo de situação em sala de aula, mas aquela resposta era novidade
até para ela.
— E para onde é?
— Para a prisão. Vê-se logo que
Nicolas é um mentiroso. Certamente é parceiro dos bandidos. Não há esquina em
Brasília, ele devia estar vigiando a rua para os criminosos. Não sei para quem
ele contou essa cascata, mas o Nicolas não estava onde disse estar, tenho
absoluta certeza. O álibi dele é falso.
Disse isso e sentou-se, recebendo
tapinhas nas costas dos colegas, enquanto ostentava um sorriso de grande
satisfação. Encafifada com a réplica inesperada e, ela precisava admitir, muito
criativa, a professora resolveu conceder uma segunda tentativa ao aluno.
— Você merece zero em português,
mas 10 em sofisma. Vou dar outra chance. Como ficaria a frase “Eu acelero meu
carro pelas ruas da capital” com o verbo no pretérito mais que perfeito?
Dessa vez, Pedro nem precisou
refletir. Retrucou de bate-pronto, com a segurança que só possuem os que têm
absoluta certeza de suas convicções.
— Essa aí eu não vou poder
responder.
— E por quê?
— Não tenho carteira, muito menos
carro. Depois, se tivesse, jamais aceleraria. O pardal pega geral, fotografa
sem pena. E você viu para quanto foram as multas, né? Aliás, muito me
envergonha você estimulando racha, com todas essas campanhas de conscientização
por aí.
A turma aplaudiu. Pedro acenou
para todos. A professora se encheu.
— Se eu fosse você, andava na
linha.
— Em Brasília, a gente anda é na
faixa.
— Pois bem, seu espertinho. Então
me diga quem é o sujeito da frase “O Pedro vai dar um grande circular na sala
do diretor.
*Publicado originalmente em Veja
Brasília de 19.nov.14
**Leia também as crônicas de Paris, escrita pelo mesmo autor, no livro
Chéri à Paris www.cheriaparis.com.br
Um comentário:
Adorei o texto, tenho apenas 1 ano e meio de Brasília e estou apaixonado pela cidade!
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