terça-feira, 25 de novembro de 2014

LIÇÃO DE BRASILIANÊS*



Daniel Cariello**

— Pedro, onde está o sujeito da frase “Enquanto os assaltantes arrombavam o banco, Nicolas tomava um suco na esquina”?
A pergunta pegou Pedro de surpresa. Do fundão, fixou os olhos na sentença escrita no quadro. Examinou cada palavra, coçou a cabeça, desviou o olhar, segurou o queixo e voltou a atenção para a lousa. Permaneceu semicatatônico por longos segundos. Depois, cheio de certeza, levantou-se, encheu o peito e soltou o veredicto.
— Não faço ideia de onde ele esteja.
— Então, é zero!
— Mas sei para onde deveria ter ido.
A professora já tinha vivido quase todo tipo de situação em sala de aula, mas aquela resposta era novidade até para ela.
— E para onde é?
— Para a prisão. Vê-se logo que Nicolas é um mentiroso. Certamente é parceiro dos bandidos. Não há esquina em Brasília, ele devia estar vigiando a rua para os criminosos. Não sei para quem ele contou essa cascata, mas o Nicolas não estava onde disse estar, tenho absoluta certeza. O álibi dele é falso.
Disse isso e sentou-se, recebendo tapinhas nas costas dos colegas, enquanto ostentava um sorriso de grande satisfação. Encafifada com a réplica inesperada e, ela precisava admitir, muito criativa, a professora resolveu conceder uma segunda tentativa ao aluno.
— Você merece zero em português, mas 10 em sofisma. Vou dar outra chance. Como ficaria a frase “Eu acelero meu carro pelas ruas da capital” com o verbo no pretérito mais que perfeito?
Dessa vez, Pedro nem precisou refletir. Retrucou de bate-pronto, com a segurança que só possuem os que têm absoluta certeza de suas convicções.
— Essa aí eu não vou poder responder.
— E por quê?
— Não tenho carteira, muito menos carro. Depois, se tivesse, jamais aceleraria. O pardal pega geral, fotografa sem pena. E você viu para quanto foram as multas, né? Aliás, muito me envergonha você estimulando racha, com todas essas campanhas de conscientização por aí.
A turma aplaudiu. Pedro acenou para todos. A professora se encheu.
— Se eu fosse você, andava na linha.
— Em Brasília, a gente anda é na faixa.
— Pois bem, seu espertinho. Então me diga quem é o sujeito da frase “O Pedro vai dar um grande circular na sala do diretor.
*Publicado originalmente em Veja Brasília de 19.nov.14
**Leia também as crônicas de Paris, escrita pelo mesmo autor, no livro Chéri à Paris www.cheriaparis.com.br

Um comentário:

Thiago Freitas disse...

Adorei o texto, tenho apenas 1 ano e meio de Brasília e estou apaixonado pela cidade!