Daniel Cariello**
Ding
dong - Acusou a campainha, com seu carregado sotaque francês.
Achei
estranho. Pensei que era um vizinho pedindo açúcar, sei lá. Abri. Parado em
frente à porta um homem grande, loiro, que suava pelas ventas. Uma mistura de
Gérard Depardieu com o brother do Jim Carrey em Show de Truman, mas um pouco
mais bizarro.
— Bonjour - Ele disse.
— Bonjour monsieur - Respondi,
caprichando no sotaque e achando que arrasava.
Daí ele desembestou a falar,
rápido, papel na mão. Entendi nada.
— Pardon?
Ele repetiu tudo de novo, na
mesmíssima velocidade. Agora pesquei uma palavra aqui e outra ali. Pelo que
saquei, era alguma coisa a ver com as férias.
— Posso ler? - Pedi, apontando
para o papel. Ele se enfezou.
— Mas é a mesma coisa que acabei
de falar duas vezes!!! - Isso eu entendi bem. E o suor passou a sair pelo nariz
também, formando umas bolhas d’água.
Aí começamos uma guerra de
nervos. Ele suando cada vez mais e eu puxando o papel, tentando entender do que
se tratava. Nossa relação não começava muito bem, pensei. Não deu para ler
tudo. A coisa degringolou de vez quando empaquei em uma palavra.
—Qu'est-ce que c'est Pâques? -
Nunca tinha visto isso antes, Pâques. Comecei a desconfiar que ele trabalhava
no zoo, ia sair de férias e estava arrecadando dinheiro pra cuidar das pacas de
lá.
Não
respondeu. O nível de tensão era alto. Pelo tanto que suava, deduzi que o cara
estava prestes a implodir. Era melhor encerrar aquele papo o mais rápido
possível. Fiz cara de mau e fiquei olhando para ele. Ele fez o mesmo, mas era
mais feio e já estava encharcado.
—Pardon monsieur, não entendi
bulhufas.
— Eu também não! - Senti meus
cabelos voarem com o calor do seu bafo.
O
cara deu as costas e saiu pelo corredor, bufando. Antes que eu pudesse fechar a
porta, deu tempo de ouvir um urro de “putain!”, algo equivalente ao nosso “puta
merda!”.
Dei
duas voltas na chave, só pra garantir.
P.S.: Pâques é Páscoa. O sujeito
devia querer uma ajuda para viajar no feriado. Ou não.
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*Esse texto faz parte do livro
Chéri à Paris, disponível agora apenas em ebook:
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**"Daniel Cariello - Escritor". Continuará abrigando as crônicas cariocas
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