segunda-feira, 30 de julho de 2012

EU, O CANDIDATO PARTE 2 – A CAMPANHA



A. J. de O. Monteiro

Resolvidos todos os trâmites legais junto à Justiça Eleitoral, o Mago Manu passou a dedicar-se à campanha. Elaborou o roteiro, a metodologia de arrecadação de fundos, listando todos os potenciais doadores, identificou lideranças comunitárias para promover encontros e reuniões e elaborou um cronograma de caminhadas pelo centro de Cajuína e nos seus principais bairros, além de visitas aos mercados públicos e feiras livres da Cidade. O corpo a corpo, o olho no olho e mão na mão eram nossas melhores opções de abordagem de eleitores devido à escassez de recursos.
 Para todas essas atividades contávamos com os dois veículos cedidos por Erosdito Pau d’Arco e com 200 litros de gasolina por semana ofertados por Jaconias Bardo.
Na primeira reunião com o “staff” de campanha, o Mago apresentou então, o tesoureiro da campanha, o Sr. Pedro Branco, apontador de jogo de bicho, mas com larga experiência em arrecadação de fundos de campanha, o qual foi logo se impondo: “Precisamos, de pronto, organizar as contas com a criação dos caixas 1 e 2”. Senti um frio na barriga. Esse sujeito vai me meter em camisa de onze varas, pensei. Mas não vou questionar o Mago.
Dando sequência à reunião o Mago fez uma explanação detalhada da cronologia e dos roteiros, distribuindo tarefas para cada um dos colaboradores e detalhando a postura pública do candidato, ou seja, eu. Tentei dar algumas opiniões e alterar algumas atividades em favor de minhas obrigações pessoais e familiares, mas o Mago reagiu com um soco na mesa e a pergunta: “Quer ganhar a eleição, ou não?”

O passo inicial e efetivo da campanha foi a gravação do vídeo para o horário eleitoral gratuito, sobre o qual argumentei: Mago como vou expor o programa de governo com apenas 30 segundos de TV? Respondeu-me ele: “Já está tudo acertado, na inserção aparecerá apenas sua fotografia fazendo o “V” de vitória (bem original, não?) e a apresentação será feita em “off” por um locutor desses que recitam as recomendações do Ministério da Saúde nas propagandas de remédios.” Mas Mago, eles falam rápido demais e ninguém entende nada daquelas mensagens... “É o que resta,” sentenciou.
Conforme o cronograma aprovado, as duas primeiras horas de cada dia de campanha foram reservados ao atendimento de eleitores, para ouvir e anotar suas reivindicações. Isso é feito no comitê de campanha, um pequeno espaço que nos foi gentilmente cedido por D. Pequena, em seu bar. Aí vinha de tudo: solicitações de consultas médicas e remédios, que eram encaminhadas para o Dr. Filho da Geladeira, o esculápio da campanha. Apareceu gente pedindo minha intermediação em briga de vizinhos e outras querelas mais. Mas o pior de tudo foi ouvir o choramingo de um marido traído que queria porque queria que eu arranjasse alguém que desse uma surra no amante de sua mulher por não se sentir apto a executar a tarefa. Vejam só a que um candidato se submete... Nas nossas ausências do comitê, a própria D. Pequena nomeada secretária de campanha pelo Mago, anotava as postulações dos eleitores que acorriam. Não foi uma boa medida pois D. Pequena não é lá muito paciente e fez mesmo foi escorraçar muitos deles.
Descrever os bastidores de uma campanha eleitoral não é exatamente algo prazeroso. É uma rotina maçante, limitada pelo rígido cronograma imposto pelo Mago, razão por que vou narrar apenas três episódios que considero relevantes: O primeiro ocorreu logo na caminhada inicial da campanha, marcada para as 12 horas do dia. Certo de que minha calva iria sentir os efeitos da canícula de Cajuína em pleno meio dia, comprei um vistoso chapéu tipo panamá e segui para o local da largada. Ao me ver com tal adereço o Mago quase teve um ataque de apoplexia: “Mas o que é isso, candidato”? Mas Mago, tentei ponderar, esse sol está de fritar miolos... E ele: “ É melhor fritar seus miolos que fritar a sua imagem já construída nas inserções de TV. Tire já isso! Esse chapéu vai confundir os eleitores. Tirei. Apenas para registrar, ele estava usando uma boina estilo Che Guevara. O segundo episódio envolveu um sobrinho do Mago, líder comunitário na vila Anísia Frutuoso, na zona rural de Cajuína, onde se realizaria a partida final do campeonato de futebol local, para a qual o Mago acertou o patrocínio dos troféus de campeão e vice, além de 12 litros de cachaça para as comemorações. No dia da final, logo nas primeiras horas de atividades do comitê, lá estava o tal líder para receber a cachaça. O Mago disse que só entregaria a bebida ao final do jogo pois assim fora o combinado. O líder, tentando sensibilizar o Mago disse: “Mas tio, tem uns seiscentos eleitores esperando... Seiscentos votos, tio.” O Mago perdeu a paciência e retrucou:  “Enfie esses seiscentos votos no fi-ó-fó!” O líder foi embora, nós não fomos à final e os seiscentos votos foram para outro candidato. O terceiro foi bastante vexatório e quase acaba em delegacia de polícia. Participávamos  de uma reunião em um povoado, também na zona rural, quando ao final apareceu uma senhora portando uma enorme bacia contendo um frito bastante suspeito: a farinha amarela e a carne bem escura e cheiro forte não me agradaram muito. Alguém bateu no meu obro e disse: “vais comer uma mambirinha...” Aproximei-me do Mago e disse-lhe ao ouvido: não vou comer isso, não... “Ah Vai, vai sim senhor, respondeu. "Quer ganhar a eleição, ou não"? Salvou-me a aproximação de uma viatura policial que provocou uma debandada geral. Ficamos só nós dois e foi difícil explicar aos policiais o que estávamos fazendo ali com aquela turma. Por sorte o motorista da viatura era fã do horário político na TV e lembrou-se da minha foto. Sorriu balançando a cabeça e nos liberou.
No final, avalio que a campanha foi bastante positiva. Tirando ter que apertar milhares de mãos suadas todos os dias, abraçar gente com suvaqueira, aguentar o bafo de cachaça matinal dos bêbados e beijar bochechas lambuzadas criancinhas fedendo a cocô, tudo correu conforme o planejamento inicial. E haja álcool gel antisséptico à noite, antes de deitar – exigência de minha mulher.
E vamos às urnas!    

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