Poncion Rodrigues
Nós todos matávamos sempre e
matávamos muito. No processo infame do aprendizado começamos a matar nos
limites dos nossos quintais. Ampliamos a atuação do hobby vil para as ruas vizinhas. Mais tarde, lá estávamos nós nos
deleitando na selvageria assassina, pela cidade e seu entorno além de sítios e
fazendas de nossos pais e dos amigos destes. Era gostoso assistir ao martírio das vítimas
baleadas, nos estertores hemorrágicos que precediam o mistério da morte; a
magia dos olhinhos suplicantes na fustigante interrogação do por que. Era
gostoso ser matador; gerava prestígio e autoestima.
Pessoalmente matei centenas,
talvez muitas dezenas de centenas. Matava quase que qualquer vida que se
movesse na terra ou voasse no céu, que não fosse gente ou avião. Carambolos,
tijubinas, camaleões tiuís. Coitados! Pobres rolinhas, pipiras, juritis,
bem-te-vis, os bobíssimos anuns e até beija-flores. Esses últimos tinham ainda
os corações arrancados e engolidos, ainda pulsando. Os anjos da morte andavam à
solta. Tratava-se do famigerado Poncion Neto e seus cruéis companheiros,
equipados com baladeiras, espingardas de pressão e os muito mortíferos rifles
de calibre 22, com munição de venda livre e abundante nas lojas do ramo.
Envergonhado, confesso que já
adulto e com rudimentos da consciência ecológica começando a fustigar-me alma,
crivei de balas um casal de camaleões que se alimentavam pacificamente de
folhas e frutos silvestres. Em madrugada de sono difícil o sentimento de culpa
me fez sofrer com raiva e pena de mim mesmo, protagonista da barbárie contra
aqueles inocentes. Hoje quero pedir perdão a Deus, quero pedir perdão às minhas
vítimas e quero, o mais difícil, pedir perdão Amim.
O que pensarão de si próprios
aqueles que se comprazem em matar gente? Em que tipo de êxtase flutua a lama de
mister Bush, o genocida do Iraque, ou de Osama Bin Laden o raivoso psicopata do
Al-Kaeda? Sabe Deus.
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