sábado, 20 de julho de 2013

A INCÔMODA VISITANTE




A. J. de O. Monteiro
                Em nossa casa as coisas acontecem inesperadamente. Chego e ouço um miado, ou um latido novo, ou mesmo um trinado, ou qualquer outra “voz” animal, ou, ainda, um esvoaçar... que pra mim prenunciam trabalho, atrapalhos... E gastos.  Já tivemos aqui cães de grande porte, de pequeno porte; com pedigree, sem pedigree e vira latas; damas e vagabundos;  gatos e gatas. Pássaros? Sim, de todas as espécies. Todos de passagens efêmeras, pois os “donos” logo se cansavam da trabalheira e desistiam do “hobby” e eu me via livre do incômodo e dos gastos com rações e veterinários.
                Qualquer um que não me conheça, ao ler o parágrafo acima certamente pensará que sou um daqueles sujeitos ranzinzas que não gostam de animais. Não é verdade. Sou daqueles lúdicos que se extasiam e veem beleza nas mais simples manifestações do mundo animal. Sou daqueles que param para admirar um bando de periquitos gritando e voando em manobras desconcertantes parecendo obedecer a um comando como nas esquadrilhas de exibição. Perco horas observando o elegante e sereno voo de um urubu, que demonstra enorme precisão em utilizar as correntes de ar (na praia, então, é um “show”). Divirto-me com a bravura e o atrevimento do pequeno bem-te-vi escorraçando o gavião que, predador, ameaça seu ninho. Não tanto quanto gostaria vou pra beira do Parnaíba e fico horas na expectativa de ver descer das árvores um camaleão para desfilar no chão o seu gingado “malemolente”.
                Teresina, apesar do crescente desmatamento provocado pela especulação imobiliária, ainda nos permite desfrutar desses prazeres: alguns já rareando, como o belíssimo trinado do canário da terra; outros mais corriqueiros como o “fogo apagou” das rolinhas e dos sangues de boi; o piado do gavião espreitando caças e o indefectível “bem-que-te-vi” do bem-te-vi que anuncia com rigorosa precisão, tanto o alvorecer quanto o crepúsculo. São apenas pequenas amostras do que já foi uma fauna grande e diversificada. Por falar nisso, quem se lembra das pequenas e barulhentas marrecas-irerê, que, em determinada época do ano, faziam de Teresina uma escala em sua rota migratória?
                Não sei se alguém já observou a quantidade de empresas imobiliárias que se instalaram na nossa capital nestes últimos anos. Até multinacionais estão operando aqui. É bom que nos preparemos para o pior, inclusive para um aumento da nossa temperatura equatorial.
                A propósito, dia desses um telejornal apresentou uma matéria sobre uma coruja que todas as noites se encastela no alto de um edifício residencial em Águas Claras, cidade satélite de Brasília/DF, e com seus estridentes piados não deixa os moradores do local dormirem o “sono dos justos”. A equipe de reportagem entrevistou alguns sonolentos moradores que emitiram opiniões politicamente corretas, mas chamaram o Corpo de Bombeiros para se livrarem da ”incômoda visitante”. A coruja, muito mais conhecedora da noite, deu um baile nos briosos “soldados do fogo” e sumiu na escuridão soltando seus piados como que avisando aos “incômodos invasores” de seu “habitat”, que na noite seguinte estará de volta...
                Há 17 anos, Águas Claras, hoje um enorme aglomerado de edifícios residenciais, era um belo pedaço de cerrado com suas árvores retorcidas e servia de morada para inúmeras espécies típicas da região, dentre elas a coruja da reportagem, que talvez esteja ali, aproveitando a onda, manifestando sua insatisfação pelo que fizeram com seu mundo...  

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