A. J. de O. Monteiro
Em
nossa casa as coisas acontecem inesperadamente. Chego e ouço um miado, ou um
latido novo, ou mesmo um trinado, ou qualquer outra “voz” animal, ou, ainda, um
esvoaçar... que pra mim prenunciam trabalho, atrapalhos... E gastos. Já tivemos aqui cães de grande porte, de
pequeno porte; com pedigree, sem pedigree e vira latas; damas e vagabundos; gatos e gatas. Pássaros? Sim, de todas as
espécies. Todos de passagens efêmeras, pois os “donos” logo se cansavam da
trabalheira e desistiam do “hobby” e eu me via livre do incômodo e dos gastos
com rações e veterinários.
Qualquer
um que não me conheça, ao ler o parágrafo acima certamente pensará que sou um
daqueles sujeitos ranzinzas que não gostam de animais. Não é verdade. Sou
daqueles lúdicos que se extasiam e veem beleza nas mais simples manifestações
do mundo animal. Sou daqueles que param para admirar um bando de periquitos
gritando e voando em manobras desconcertantes parecendo obedecer a um comando
como nas esquadrilhas de exibição. Perco horas observando o elegante e sereno
voo de um urubu, que demonstra enorme precisão em utilizar as correntes de ar
(na praia, então, é um “show”). Divirto-me com a bravura e o atrevimento do
pequeno bem-te-vi escorraçando o gavião que, predador, ameaça seu ninho. Não
tanto quanto gostaria vou pra beira do Parnaíba e fico horas na expectativa de
ver descer das árvores um camaleão para desfilar no chão o seu gingado
“malemolente”.
Teresina,
apesar do crescente desmatamento provocado pela especulação imobiliária, ainda
nos permite desfrutar desses prazeres: alguns já rareando, como o belíssimo
trinado do canário da terra; outros mais corriqueiros como o “fogo apagou” das
rolinhas e dos sangues de boi; o piado do gavião espreitando caças e o
indefectível “bem-que-te-vi” do bem-te-vi que anuncia com rigorosa precisão,
tanto o alvorecer quanto o crepúsculo. São apenas pequenas amostras do que já
foi uma fauna grande e diversificada. Por falar nisso, quem se lembra das
pequenas e barulhentas marrecas-irerê, que, em determinada época do ano, faziam
de Teresina uma escala em sua rota migratória?
Não
sei se alguém já observou a quantidade de empresas imobiliárias que se
instalaram na nossa capital nestes últimos anos. Até multinacionais estão
operando aqui. É bom que nos preparemos para o pior, inclusive para um aumento
da nossa temperatura equatorial.
A
propósito, dia desses um telejornal apresentou uma matéria sobre uma coruja que
todas as noites se encastela no alto de um edifício residencial em Águas Claras,
cidade satélite de Brasília/DF, e com seus estridentes piados não deixa os
moradores do local dormirem o “sono dos justos”. A equipe de reportagem
entrevistou alguns sonolentos moradores que emitiram opiniões politicamente
corretas, mas chamaram o Corpo de Bombeiros para se livrarem da ”incômoda
visitante”. A coruja, muito mais conhecedora da noite, deu um baile nos briosos
“soldados do fogo” e sumiu na escuridão soltando seus piados como que avisando
aos “incômodos invasores” de seu “habitat”, que na noite seguinte estará de
volta...
Há 17 anos, Águas Claras, hoje um enorme
aglomerado de edifícios residenciais, era um belo pedaço de cerrado com suas
árvores retorcidas e servia de morada para inúmeras espécies típicas da região,
dentre elas a coruja da reportagem, que talvez esteja ali, aproveitando a onda,
manifestando sua insatisfação pelo que fizeram com seu mundo...
Nenhum comentário:
Postar um comentário