sexta-feira, 19 de julho de 2013

PLEBISCITO



(*)Ferrer Freitas
              Plebiscito é a palavra da moda.  A mais pronunciada de quantas são originárias da “última flor do Lácio”, tudo por conta das manifestações de rua que pegaram todos de surpresa.  E imaginávamos que o país vivia na mais absoluta normalidade, num sétimo céu, expressão que no Islamismo significa “paraíso”.  De repente, como um tsunami, ocorre o que ninguém mais esperava o povo nas ruas a bradar contra a falta de saúde, educação, segurança, transporte, de tudo enfim.  Pegou o governo de calças curtas, para usar uma expressão tão ao gosto de todos. Não lembro, no entanto, de nenhuma faixa pedindo a realização de um plebiscito. Mas, o governo acha que é a saída, o que me fez lembrar do conto de mesmo nome do maranhense de São Luís, Artur Nabantino Gonçalves de Azevedo, mais conhecido por Artur Azevedo, dramaturgo, contista, poeta e irmão do também escritor Aluízio Azevedo, autor, entre outras obras, de “O Cortiço”.
             O texto é de 1890 e narra, com fino humor, o alvoroço criado em roda familiar a partir de pergunta feita ao pai por filho para saber o significado de plebiscito. A cena é passada logo após o jantar, o homem ainda palitando os dentes, conforme o autor. Sem saber a reposta, faz de tudo para se livrar do incômodo, simulando até uma soneca, o que leva a esposa a reclamar ser inadmissível aquilo. O jeito foi, tentando demonstrar certa irritação, passar da sala para o quarto, o que foi de extrema valia, pois logo encontrou um dicionário, certificando-se imediatamente do significado da palavra que repassou a todos sem dar nenhuma pista, voltando à sala: “Plebiscito é uma lei decretada pelo povo romano, estabelecido em comícios”. E acrescentou ainda, com ar superior: “uma lei romana, percebem? E querem introduzi-la no Brasil. É mais um estrangeirismo”.
            Pois bem. As manifestações de rua, muitas, lamentavelmente, infestadas de vândalos e saqueadores, levou nossa presidente a convocar todos os governadores e prefeitos de capital para reunião que resultou, sem que muitos entendessem, na realização de um plebiscito, já valendo para a eleição de 2014. Antes, aventou-se a possibilidade de uma constituinte, sugestão logo deixada de lado. Mas, afinal, o que tem a ver a decisão tomada com os protestos?  O que menos ouvi foram palavras de ordem clamando por reforma política, que, diga-se, é necessária, mas não com a urgência que se quer dar ao assunto.  E tem mais, segundo juristas e cientistas políticos, a consulta plebiscitária tem que ser, antes de tudo, binária. Em outras palavras, “sim” ou “não”. E não é isso que se pretende fazer, pelo andar da carruagem. A proposta, parece, é mais para deixar a população atônita, sem reposta, tal qual ficou o personagem do primoroso conto de Artur Azevedo.  

             (*) Ferrer Freitas é do Instituto Histórico de Oeiras

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