Tesourinhas. |
Daniel Cariello**
-
Alô!
-
Alô!
-
Tá onde?
-
Aqui, onde marcamos.
-
Eu também, mas não te vejo.
-
Mas eu tô aqui, na rua das farmácias.
‘ -
Das farmácias? Você não disse das torcidas?
-
Não, de jeito nenhum. Eu disse pra
você pegar o carro, passar pela rua das torcidas, virar no balão, pegar a rua
das elétricas, seguir pelo Eixinho W e
entrar quando visse a rua das farmácias.
-
Putz. Vou voltar para o carro. Já
chego.
-
Alô!
-
Alô!
-
Tá onde?
-
Mesmo lugar, rua das farmácias, te esperando. E você?
-
Eu estou na rua, em frente a uma farmácia, mas não sei se é a rua das
farmácias. Pera aí, vou perguntar pra um carinha aqui.
-
...
-
Ele disse que me enganei completamente. Aqui é a rua das noivas. Parece que
passei muito.
-
Passou mesmo. Faz a tesourinha e volta pra
Asa Sul. È logo depois da rodoviária, fácil de ver.
-
Alô!
-
Alô!
-
Cara, tô perdido.
-
Isso eu já sei faz tempo.
-
Descobri que parei na rua dos restaurantes. Aproveitei pra comer um sanduba, que a fome apertou. Você não que me encontrar
aqui?
-
Como? Tô a pé. Daqui até aí é perto, mas complicado de ir. Ou cruzo o Eixão,
arriscadíssimo, ou atravesso pelas passarelas subterrâneas, superperigosas, ou
então pego um ônibus, que vai demorar eras, pois vai dar a volta em toda a Asa
Sul. É melhor você vir pra cá. Tá chegando perto, uma hora você
encontra.
-
Aaaaalô!
-
Alô!
-
Tô na rua das farmácias.
-
Finalmente!
-
Mas não te vejo.
-
Você tá em qual delas?
-
Hã?
-
Tem duas ruas das farmácias. A da 300 e a da 100.
-
Sei lá, tô perto da W3.
-
Tá
na 300. Tô indo aí.
-
O.K.!
-
Fala rapaz.
-
Que complicação, hein? Achei que você não fosse chegar nunca.
-
Eu também.
-
Então, vamos fazer o quê?
-
Você, que conhece tudo aqui, me leva pra
rua das redes. Depois dessas voltas, tô
precisando tomar uma aspirina e dar uma esticada.
*Originalmente publicado na revista Veja Brasília, de 27 de novembro de 2013.
** Daniel Cariello nasceu em
Brasília, em 1974. Em 2007, mudou-se para Paris, onde foi editor-chefe da
revista bilíngue Brazuca, sobre cultura brasileira. É formado em publicidade
pela Universidade de Brasília e mestre em jornalismo cultural pela Université
de Paris III – Sorbonne Nouvelle.
Já foi office-boy, guitarrista e
tecladista em banda de rock, cronista, jornalista e publicitário. Queria ser
reconhecido pela música, mas ganhou prêmios nacionais e internacionais
escrevendo para revistas e agências de propaganda.
Criou o site Chéri à Paris em
2007, onde publicou, semanalmente, crônicas contando as desventuras de um brasileiro
na terra do fromage. De volta ao Brasil, tornou-se cronista da revista Meiaum
e, desde junho de 2013, da Veja Brasília. Seus textos podem ser encontrados
quinzenalmente na última página da publicação. O seu livro Chéri à Paris pode
ser adquirido através de www.cheriaparis.com.br
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