Daniel Cariello**
Ali pelos meus
11 anos, descobri a puberdade e as revistinhas de sacanagem (N.R.: Jovem, não
havia ainda internet e muito menos o XVideos. A vida era mais dura, se é que
você me entende). Na minha cabeça, tudo aconteceu ao mesmo tempo, em uma
explosão de hormônios iniciada quando o primeiro exemplar desses gibis eróticos
caiu no meu colo (ops!), trazido pelo Wagner, cujo pai possuía uma banca de
revistas usadas, paraíso do pornô impresso.
Durante boa
parte da minha adolescência, Wagner teve o papel de fornecer o enredo - ou o
enredo de fornecer o papel, você decide a melhor construção - das minhas
fantasias eróticas. Usava sempre a mesma estratégia: chegava com uma Bizz
antiga recheada de diversos exemplares de magazines libidinosos, que eram os
primeiros a serem devorados. A Bizz, dedicada à música, era lida depois. Uma
espécie de cigarro pós-coito.
Nessa época,
passava na TV a novela Roque Santeiro. Um boato na escola, provavelmente
espalhado pelo André Bolinha, garantia que às 4 da manhã a Rede Globo exibia as
cenas proibidas do folhetim, com os atores fazendo sexo de verdade. De verdade!
No dia seguinte, é óbvio, eu me levantei às 3h55 e liguei a televisão da sala,
sintonizando aqueles chuviscos que passavam enquanto a programação não entrava
no ar. As cenas surgiriam ali, sem aviso prévio, juravam os colegas. Lutei
contra o sono cada segundo até amanhecer, a causa valia a pena, mas nada
apareceu. Repeti a operação algumas vezes, sem sucesso. Fiquei frustradíssimo
de não conseguir acompanhar as atuações impudicas da Patrícia Pillar, da Cássia
Kiss, da Cláudia Raia, da Ísis de Oliveira e até mesmo da Yoná Magalhães, que
já tinha seus 50 anos mas continuava em grande forma.
Mas aí veio a
Playboy, que se não mostrava sexo explícito, compensava essa falha (aos olhos
esbugalhados de um adolescente espinhento) publicando em suas páginas as
grandes musas da época, diversas delas atrizes de TV, peladinhas da silva.
Agora, a revista avisou que isso não vai mais ter, já que nudez se encontra
facilmente na internet. Mas eu falava da Playboy. Pois em pleno auge de Roque
Santeiro, uma de suas edições trouxe justamente a já cinquentona Yoná Magalhães
na capa. Um exemplar chegou à casa dos meus avós paternos e foi longamente
analisado e elogiado por todos os adultos da família. Quando chegaria minha vez
de ter o Graal em mãos, ele confiscado pela minha vigilante avó, sob protestos
meus e do meu avô, o segundo fornecedor de pornografia da minha mocidade.
“Deixa o menino ler”, dizia ele, empregando o verbo errado.
Pois minha avó
não deixou. E ainda escondeu a revista, lançando um desafio: “Vou sair. Se você
encontrá-la, pode ficar com ela”. Tudo o que eu queria era ficar com ela, então
a procurei como se minha vida dependesse disso. A sexual, naquela tarde
modorrenta, dependia, isso é certo. Fucei em todos os cantos, mas não
encontrei. Nunca a encontrei, bem como o meu avô-parceiro. Minha avó talvez a
tenha dado a alguém menos imberbe. Ou se esquecera de onde a guardara.
A ausência da
Playboy da Yoná, assim como das cenas proibidas da novela, atiçaram ainda mais
a minha já fértil imaginação adolescente e entraram para o panteão das
frustrações sexuais da minha debutante puberdade. Frustrações virtuais, claro,
já que minha timidez e falta de jeito não me permitiam me aproximar das meninas
sem tropeçar no meio do caminho.
A Yoná se foi
ontem, aos 80 anos, ainda bela. No meio da chuva de textos em sua homenagem,
alguém postou um link para o ensaio da Playboy. O adolescente que ainda mora
dentro de mim estava louco para ver. Mas eu não deixei, insistindo na
importância de cultivar a fantasia em um mundo tão bombardeado por imagens.
**Leia também as crônicas de Paris, escrita pelo mesmo autor, no livro Chéri à Pariswww.cheriaparis.com.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário