Daniel Cariello**
Na mesa do bar, enquanto Joca
dava beijinhos do seu pescoço, a Flávia anunciou que ia preparar um jantar
romântico na casa dela.
— Galinhada e arroz com pequi.
O Joca se assustou e parou com os
beijos.
— Pequi? Por quê?
A Flávia, viciada no fruto, nem
se ligou. E empurrou o rosto do Joca de volta ao seu pescoço.
— Porque é bom, oras. Continua.
O Joca nunca tocara no assunto,
mas não suportava pequi, nem o cheiro, nada. Culpa do Tio Onofre, dizia.
— Flávia, pequi não dá.
— Dá, sim, tá na época.
— Tá na época de alguém fazer
algo contra essa ameaça e bani-la do Sistema Solar. Não como nem amarrado.
Pequi ainda não está pronto, veja bem, os espinhos nem tiveram tempo de sair do
fruto. Daqui a mil anos, talvez. Darwin, entende? Enquanto isso, vamos deixá-lo
quieto.
A Flávia nunca pensara que o Joca
tivesse inclinações radicais, e conclamou uma assembleia à mesa, com direito a
voto de todos os amigos. O que eles decidissem seria aceito pelo casal.
— Então, pequi or not pequi?
— Pequi, disse a Marlene. O Joca
tem que aceitá-la como você é.
— Pequi, bradou a Flora.
— Not pequi, discordou o Pedro.
O voto de Minerva ficou com a
Jussara e todos já consideravam a questão resolvida em favor da Flávia.
— Not pequi, vaticinou a amiga,
para espanto geral.
— Not pequi?
— Not pequi! Mas precisa ser
negociado. Você pode barrar o pequi se ele cortar os jogos do Flamengo na TV,
por exemplo.
O Joca tentou tumultuar a
conversa, argumentando que isso era injusto, o Flamengo era sagrado, o
campeonato de 87 era deles etecetera e tal. Depois de muita discussão, chegaram
ao acordo: quando estivessem juntos, not pequi e not Flamengo. No resto do
tempo, cada um fazia o que desse na telha.
Foram pra casa da Flávia, que,
conformada, guardou os frutos no fundo da geladeira. Desiludido, o Joca não
ligou a TV. Resignada, a Flávia foi tomar banho. Vencido, o Joca colocou
Caetano. Confortável, a Flávia voltou à sala vestindo um par de Crocs.
Horrorizado, o Joca levou as mãos à cabeça, ergueu-se do sofá, abriu a porta e
foi embora sem dizer uma palavra.
No táxi, perguntava-se onde havia
errado, pequi e Crocs eram demais pra ele. E a Flávia, a bem da verdade, também
não suportava o Caetano.
**Leia também as crônicas de Paris, escrita pelo mesmo autor, no livro Chéri à Paris www.cheriaparis.com.br
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