sábado, 1 de junho de 2019

FILHO DE PEIXE



Carlos Alberto Monteiro Falcão
            É, parece que isso tá no sangue mesmo. Essa história  toda começou quando uma mocinha  de 14 anos, franzina, filha de um respeitado senhor da capital piauiense se encantou por um caipira do interior do Maranhão, mais velho, já cuidando da vida. Roubou a donzela quase criança, numa operação digna dos romances cinema. Ânimos apaziguados,   a colegial foi  levada para morar  em um bairro da  “princesinha do sertão”, naquela época,  zona rural, com poucas casas, sem energia elétrica ou água encanada e praticamente às margens do riacho  do Ponte, que é formado nas proximidades da cidade pelo riacho Inhamum e várias outras nascentes, acima do banho do Tintor.
            Muito diferente de hoje, era um mundão d`água que cortava o bairro, proporcionando aos moradores vários portos, os quais eram concorridos por banhistas, pescadores de piabas e lavadeiras com  trouxas de roupa.  Riacho de águas límpidas e cristalinas,  cercado por areia branca,  por lajes e pedras que guardavam histórias e lendas de sucuris e outros monstros das águas. Não deu outra, aquela menina, que mal tinha deixado as bonecas, entre uma barrigada e outra, se deliciava com a magia do riacho, tomando banho nas suas águas frias, pescando piabas e mandis. As iscas eram variadas, desde o arroz cozido, minhocas e até larvas de insetos removidos do coco babaçu.  Toda essa farra acontecia na maioria das vezes, sem a autorização do Sr. Gonzaga. Isso foi motivo de muitas desavenças do casal.
            Foi nesse contexto, em uma das barrigadas, que nascemos em casa, como dizia um amigo “em baixo de mangueira” na quinta da casa grande. Claro que  com a ajuda das mãos habilidosas e místicas da Dona Adelaide, famosa parteira, que morava lá para as bandas da Trizidela.  O contato e paixão pelo riacho do ponte foi inevitável.  As tardes se resumiam na espera impaciente até o corpo “esfriar” por conta do almoço. Enquanto isso, nos divertíamos derrubando manga de fiapo para nos deliciarmos também à  beira do riacho, e depois,  momentos de banho  e pescaria. Vara colhida no bambuzal da beira do riacho, linha de náilon 0,25 de um pouco mais que um metro e um pequeno anzol para pegar piaba. Festa completa. Esse deleite só acabava quando começava a escurecer.  Os olhos já vermelhos e a as mãos enrugadas de tanto ficar de molho. A briga era garantida... vai ficar doente! Nada que um bom lambedor feito com mel de abelha tiúba, abundante na região naquela época, com azeite de pequi, limão e outros componentes guardados  a sete chaves pela rezadeira da região. Com uma infância como essa, é difícil não se apaixonar pelas águas com seus encantos e mistérios. Reza a lenda que quem foi batizado e bebeu das águas do riacho do Ponte, nunca esquece Caxias.

Um comentário:

Ajom Monteiro disse...

Bons tempos aqueles do Ponte.