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| Praça Dias Carneiro (Pantheon) - Caxias/MA |
Carlos
Alberto Monteiro Falcão
Em um fatídico 2 de janeiro de 1971, na minha tenra
lembrança, um dia triste e chuvoso, Tio
“Manelão” como era conhecido na cidade apareceu à porta da casa e anunciou que nas
primeiras horas do dia tinha ocorrido o falecimento do patriarca da família, na
distante cidade do Rio de Janeiro. Na inocência dos poucos anos de idade, o
entendimento sobre a gravidade do momento veio pelo semblante de consternação
do responsável pela infeliz notícia e pelo pranto dos irmãos mais velhos.
Após o período de luto absoluto, como era de costume na
época, minha mãe decidiu sair do Ponte e
morar “nas Caxias”, como até hoje os moradores do bairro chamam o
centro da cidade... Caxias. Precisávamos ficar mais perto do comércio no mercado
Central. Lá fomos morar na rua São José, em uma casa grande, ao lado da antiga
fábrica de tecidos, bem próximo do colégio das irmãs, onde estudávamos. Aos poucos fomos nos acostumando com aquela
vida agitada, uma verdadeira muvuca. Os dias pareciam começar mais cedo com a
chegada dos frequentadores e trabalhadores do mercado.
A rua tinha amendoeiras
gigantes, as quais serviam de estacionamento para animais de carga que
traziam iguarias para serem negociadas no mercado. Toda manhã, para ir à escola, enfrentava a travessia da feira e, se ainda
estava meio sonolento, despertava com a gritaria dos feirantes, como se quem
gritasse mais alto conquistasse o cliente como um passe de mágica. Essa magia me
tornou um amante dos mercados. Em todas as cidades onde passo, o Mercado Municipal
faz parte do roteiro turístico.
À tarde, o
compromisso era com o comércio no mercado.
Entre os fardos de farinha, arroz e feijão, fazíamos os deveres de
matemática, português e ciências. Utilizava caroços de feijão e milho para decorar
a tabuada. É, mas entre uma tarefa e outra e às vezes, no meio da tarefa, o
pensamento viajava para o saudoso Bairro Ponte, mais precisamente, para o riacho
do Ponte... para as pescarias e banhos
nos portos da bacia, do tintor, da maçonaria e AABB, contando os dias para
chegar as tão sonhadas férias. Daí era
só organizar a mochila e pegar a Kombi na praça do Pantheon. Era uma grande
aventura... sempre muito lotada, com portas abertas e o cobrador com parte do
corpo do lado de fora, anunciando que saía mais uma condução para o “paraíso”.
A medida que nos aproximávamos, ficava mais eufórico na expectativa de
encontrar os companheiros de pescaria.
Os gêmeos Bina e
Nonatin, sobrinhos de sangue da Tia Carmem, tia de coração, porque a adotei como tal, ou melhor, fui
adotado por ela. Senhorinha simples, que
nunca casou-se e dedicou a sua vida na criação dos sobrinhos. Fazia doces para
complementar a renda da aposentadoria, os quais eram vendidos na porta de casa
ou na quitanda do seu Mimí. Pra mim tudo era mágico, adorava passar as
goiabas na arupemba, remover os caroços e preparar a massa para
fazer doces e cocadas.
Mas voltando aos parceiros gêmeos, estes são filhos do mais importante e
habilidoso marceneiro da região. A maioria dos móveis dos moradores do bairro
foi fabricado por ele e o seus filhos, que, desde cedo já demonstravam a mesma
habilidade. Fabricavam brinquedos com perfeição, o que gerava algum dinheiro. O
Nonatin, teve paralisia infantil, o que o deixou com uma perna maior que a
outra, o que não o impedia de correr e até jogar futebol, sem falar que a
deficiência até parecia facilitar o seu desempenho nas águas do riacho. Nadava
com muita habilidade, superando vários garotos da sua idade. Os mais velhos
diziam que Deus o aleijou para não perdê-lo de vista, não deu certo.
Nessas férias, os dias começavam bem cedo, antes mesmo do
café da manha já estávamos na beira do riacho passarinhando. Baladeiras na mão
e um mocó cheio de pedras selecionadas com cuidado para serem as mais certeiras
possíveis. Coitado dos pobres passarinhos.
Quando o sol esquentava, hora da pescaria e depois o banho nas águas
límpidas daquele imenso riacho.... saudades dessa época!.

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