Daniel Cariello**
Trim, trim, o
interfone trinou. Alô? Bom dia, seu Daniel, vai subir o rapaz da água, o
porteiro alertou. Não pedi água. Ele não pediu água, a voz do outro lado da
linha comentou com seu interlocutor. O rapaz da água não veio trazer água, veio
consertar sua água, quer dizer, o vazamento de água, concluiu. Então, pode
subir. Tá subindo.
Opa, vamos
entran… Ei, você não é o Jorge, perguntei por retórica, pois o reconheci na
hora. Ih, caraca, já vim aqui antes, fazer um serviço de gasista!, respondeu,
com ar espantado. Mais espantado estava eu, em vê-lo em versão bombeiro
hidráulico. Você também é bombeiro hidráulico? Sou, a gente gosta de
diversificar.
Fiquei olhando
para o Jorge que gosta de diversificar e lembrei-me da sua atuação no ajuste do
meu fogão de botijão para o gás de rua. Pode ficar tranquilo, meu jovem, esse é
o meu trabalho, disse, lendo meus pensamentos. Não fiquei nada tranquilo e
torci muito para seu desempenho nas bricolagens líquidas ser melhor que nas
gasosas.
Onde está o
fogão, ele perguntou. Que fogão? O que precisa consertar. Não precisa consertar
fogão nenhum. Ué, não precisa? Não. Se já tá funcionando, então vou indo. Vai
não, seu Jorge, que eu chamei você aqui foi pra reparar um vazamento. Tá
vazando gás? Não, tá vazando água embaixo da pia. Então é melhor arrumar. Por
favor, seu Jorge, por favor.
Meu jovem, tem
uma lanterna aí? Pra quê? Pra eu olhar embaixo da pia. Você não trouxe
lanterna? A gente não trouxe, dessa vez. A gente esquece muita coisa, né, seu
Jorge? Ô. Só tenho a lanterna do celular, pode ser? Pode ser. Entreguei o
celular e fui atender a uma ligação no telefone fixo. Era a minha operadora de
TV a cabo me propondo de assinar o serviço de TV a cabo deles. Recusei e achei
estranho o atendente falar “não tem problema nenhum”, quando percebi que quem
falava “não tem problema nenhum” era o Jorge.
Fui verificar
se não havia problema nenhum e percebi que havia um quando o procurei no
banheiro e encontrei na cozinha, me apontando o cifão da pia de louças. Esse
está perfeito. Esse está, eu disse. Então não há nada a fazer, já vou indo. Vai
não, seu Jorge, que o problema está na pia do banheiro. Por que você não disse
logo, meu jovem? Por quê, me perguntei dez vezes.
Levei-o ao
banheiro, para ter certeza de que chegaríamos lá. Onde está o vazamento? Ali, é
o cifão da pia, tem uma peça quebrada. Vou ver. Vai, por favor. Ó, é o cifão da
pia, tem uma peça quebrada, gritou pra mim, que estava ao seu lado. Já tô
sabendo, vamos trocar. Não vai dar. Não vai dar? A gente não trouxe o cifão. A
gente não trouxe o cifão? Não trouxe, dessa vez, meu jovem. E agora, o que a
gente faz? Agora o melhor é a gente ligar lá na empresa pra agendar uma outra
visita e pedir pra mandarem um cifão, não acha? Olhei pra ele com uma cara desolada,
a gente já não sabia mais o que achar.
Ficou curioso pra saber as
origens de seu Jorge? Aqui está a primeira história do sujeito, quando ele se
apresentou com seu avatar de gasista: http://bit.ly/1nnY9p1
**Leia também as crônicas de Paris, escrita pelo mesmo autor, no livro Chéri à Paris www.cheriaparis.com.br
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