Manoel Emilio Burlamaqui de Oliveira
Ele vem, e
vai, quando quer, de acordo com sua curiosidade, com sua saudade, com sua
amizade... A nossa é antiga, do tempo em que tive um sítio , pras bandas da
Mata do Soim, onde ele se escondia (hoje, não mais sei onde mora) e que
frequentava, de vez em quando, para bater um papo, tomar tenência, contar
"causos" e gozar dos feitos dos homens de hoje, tão parecidos com os
dos outros homens, de épocas passadas, segundo ele, tudo acompanhado de uma
cachacinha com tira-gostos, que nem ele era de ferro! (Sempre perguntava a
razão do nome "tira-gosto", já que o gosto era uma beleza...)
Falo de uma
figura mítica, o Mago Manu, desterrado, por seu chefe, Marlim, das plagas do
Rei Arthur, por ter querido ajudar certo Cavaleiro da Távola Redonda a botar um
par de chifres no capacete real...
A lembrança
não veio atoa. No amanhecer do 1º dia do ano, a campainha do portão de casa
começou a tocar, insistentemente, até que, saindo do agradável estado de um
sonhador, fui ver quem nos incomodava em pleno raiar do sol... Deparei-me com
um maltrapilho sorridente, dando-me “bom dia, Andante"! Forcei a vista,
pronto a dar umas bengaladas ao abusado, quando percebi que o atrevido não era
outro senão o Mago! Mais que depressa, ele tirou da cintura a sua varinha, e,
com um gesto, suas vestes voltaram ao normal, parecendo o Papa, todo de branco,
mudando, apenas, o solidéu, para o conhecido gorro pontudo dos magos. Vôte, que
susto me deu essa entrada de ano!
—"Assuste-se
não, amigo velho, é uma fantasia que uso, com medo dos assaltos. Ninguém rouba
dos miseráveis, só os maus políticos, que ainda dormem, sonhando com novas
falcatruas"! Rí do Mago, mandei-o entrar e abancar-se no terraço, para
conversarmos, à espera de um café suculento, que só minha mulher sabe fazer,
depois que o resto da família acordasse.
—"Estou
de muda, não aguento mais essa era", declarou de supetão. "Pegaram-me
de surpresa, mudaram o sentido e o valor das palavras, e, por cima de tudo, quiseram
me apedrejar!" Aí, quem não aguentou fui eu! Quem poderia querer maltratar
uma pessoa que só desejava o bem dos outros? Pedi-lhe que me contasse tudo. E,
ele o fez:
—"Magos
não são mágicos, magias não são mágicas. Mas existem, mágicos, que não
frequentam circos, nem os circos são como antes . Hoje, há um tal de Congresso,
onde congressistas mágicos não retiram coelhos da cartola, mas dinheiro do
bolso do povo !" "E há uma tal de loteria que sorteou 280.000.000 de
reais e deixou as pessoas malucas, a ponto de me procurarem para que seus
bilhetes fossem premiados! Como lhes disse que não fazia mágica e que minha
magia não mudava a sorte de ninguém, jogaram pedras em mim!" "Também,
surgiram , neste fim-de-ano, magos de todos os tipos, a prever futuros
encomendados, ou a enganar os tolos, sem bananas e bolos, mas prontos a gastar
seu rico dinheirinho em troca de promessas de um novo ano maravilhoso... Credo,
vou-me para a Pasárgada, ou, ainda estou pensando, para a terra dos Buendia –
Macondo – a convite de um contemporâneo do Gabriel Garcia Marques..."
Tomamos o café
sem defeitos, lamentei sua decisão, mas fi-lo prometer que, sempre, nos faria
novas visitas e desejei-lhe maior respeito dos mais novos...
Ganhei um
presente dele "Magos e magias sempre existirão, pois habitam o coração das
crianças, dos adultos, que, vira e torna, voltam a ser crianças, dos que se veem
em cada um de seus semelhantes, dos que acreditam no bem, dos construtores de
um mundo melhor, desses que são os verdadeiros magos sem que disso se
apercebam... adeus, amigo velho!"
Obs.: Tenho a impressão de que, quem convidou o
Mago Manu para conhecer o Garcia Marques, foi um amigo comum, o cronista A. J.
de O. Monteiro...
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