Fabiana Motta
No início de
fevereiro enterramos o corpo físico do meu pai. A vida já havia mudado por aqui
quando a pandemia aportou no Brasil. Minha mãe, agora viúva, vestiu as cores da
aposentadoria para escapar da tragédia. Estamos todos em casa, nós, a falta do
meu pai e a incerteza.
Enquanto a
realidade apavora, a arte nos oferece o abrigo. Minha mãe acompanha
fervorosamente as lives da Tereza Cristina. Se empolga, canta junto, nos chama
pra dividir o entusiasmo. Toda noite a voz dessa mulher ressoa pelas quatro paredes
do quarto dos meus pais; do quarto da minha mãe, encobertando o silêncio que
insiste em doer.
Eu não lembro da
minha mãe fã. Essa versão dela é feliz e isso me faz bem. Eu já fui fã em
outras perdas. Música pra mim sempre teve esse papel de remédio e oração. De
cura mesmo. Dessa vez, estranhamente, não recorri a ela. Acho que por hora,
estou anestesiada de memórias. Ainda assim, escuto ao fundo a voz de Tereza
alegrando minha mãe. Meu coração se acalma. É devagar que se vive. Essa
confusão de mundo nos ensina a ter coragem.

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