terça-feira, 7 de julho de 2020

PESCARIA NA PANDEMIA.





Carlos Alberto Monteiro Falcão

         Nem tinha noção que viveria o suficiente para me deparar com uma pandemia. A vida de confinamento é estressante,  mas sair de casa e enfrentar a sociedade em  meio a esse alvoroço é bem pior. A necessidade de comprar uns “cachés” de uso contínuo me fez sair de casa, mesmo em pânico. Já na drogaria próxima de casa, tive uma sensação digna de filmes de pestes ou invasões alienígenas, em que cada pessoa que se aproximava parecia um inimigo, ou melhor, um infectado e infectante em potencial.  Parecia até  que olhar no olho das pessoas seria o suficiente para a contaminação e, mesmo usando máscara,  se falava muito pouco e sempre de cabeça baixa.  A cada cinco minutos, um punhado de álcool em gel era derramado nas mãos, seguidos de 20 segundos de fricção, mesmo sem tocar em nada ou se aproximar de alguém. Após a aquisição dos remédios,  a chegada em casa  ainda foi mais tensa. Sapatos, chaves e outros objetos no terraço, direto para o banheiro dos fundos, roupas descartadas em lugar apropriado e um banho demorado.  Muito shampoo para pouco cabelo. Com tanta confusão, uma pescaria  nas águas barrentas do velho  monge seria muito relaxante.  
         Pronto, tá decidido, vou pescar no final de semana!  Hora de organizar as tralhas e agora faz parte também, um bom frasco de álcool em gel e, pelo menos três ou quatro máscaras. A expectativa  e ansiedade eram grandes.  Logo cedo, o custo  foi carregar o carro e sair.
 — Bom dia Reginaldo,
 — Bom dia! Onde o Sr. vai tão cedo e sem máscara? Questionou o porteiro do condomínio. Dei meia volta! Ficou em cima da mesa.
        Vidros semiabertos para não ligar o ar, rádio ligado em uma emissora nacional, comentando a quantidade de novos casos, o que aumentava ainda mais a minha indignação pela quantidade de carros rodando em pleno domingo de "loockdown" parcial. No meio caminho, o stress de uma barreira da PM, questionando sobre  meu destino e claro, dando orientações sobre o afastamento social e uso de máscara e álcool em gel. Enfim, chegamos no “Beco do Sossego”.  Agora é só tranquilidade e descontração. O caseiro Nivaldo já  me esperava na entrada e quando brequei, já foi entrando no carro sem usar a máscara. Instintivamente pulei fora com uma habilidade que nem sabia que ainda tinha

— Você está louco? Cadê a sua máscara?
— Esqueci em casa. Respondeu o pobre rapaz constrangido.
Tá vendo como é importante andar com máscaras de reserva?  Resolvido a pendenga,  fomos direto para a beira do rio. O embarque do material de pesca foi um pouco tumultuado.  Lá se foi quase meio frasco de álcool em gel, sempre com o devido cuidado para manter a distância.   
Rio acima,  paramos no primeiro ponto de pesca. E agora? O que fazer? Quando higienizar as mãos? Lava no rio ou passa o álcool? Passa álcool nas iscas também? Nessa confusão, quase todas as iscas caíram nas águas do rio para deleite dos peixes.
Enfim, começamos a pescaria.  Como sempre, o velho monge não nos decepciona.  Uma meia dúzia de piaus de coco um pouco maior que um palmo e alguns mandis do mesmo porte começaram animar a pescaria. Só começaram, porque o remanescente de isca acabou quando os peixes mais “batiam”.  E para fechar com chave de ouro, com a última isca consegui capturar um “mandi cabeça de cavalo” que, na ânsia de removê-lo do anzol, me descuidei e como consequência, levei uma boa ferroada na mão.
Só me restou voltar para o meu  quartel general, único lugar que me sinto seguro. Tudo isso depois de uma pescaria para diminuir o stress.

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