Marcelo D'Alencourt*
Ando pela rua e vejo jogado no
chão um plástico preto. O que será? Saco de lixo? Acho que não. Plásticos
pretos abandonados na rua sempre me fazem recordar acidentes e mortes. Alguém
atropelado, por exemplo. Simplesmente um enfarte fulminante ou um mal súbito.
Parece macabro mas é como vejo. Lembro de, muito jovem, ter visto uma pessoa
morta envolta num desses. Todos olhavam. Minha mãe pôs as mãos na minha face e
tentou impedir mas, arisco, as driblei pra constatar a miséria que é o fim do
homem. Jamais esqueci a cena. Não me recordo da pessoa, mas do plástico...Rua
pública, chão frio ou quente e gente bisbilhoteira ao redor esperando o
rabecão. E sobram arrogância e vaidade nas pessoas. Pena! Mas e esse aí? O que
aconteceu? Ajoelho diante do plástico jogado e oro resignado pra que ele ou ela
esteja bem, mesmo que a caminho do buraco ou fogueira que o levarão eternamente
pra algum lugar ou não. Levanto, estico as pernas, me recomponho e sigo
adiante. Ninguém se atreve a tocar no mórbido material. Deve trazer mau agouro
ou coisa parecida. Ele se move, levanta e voa livremente entre os carros e
transeuntes num grande balé. Todos se afastam. Me divirto e vou com ele, sem
pressa e sem rumo. Até que aparece um gari que, sem opção, o recolhe
indiferente. Fim de festa. Aquilo me traz um vazio profundo. Procuro por mim e
não encontro. Fiquei pra trás. Tento recuperar o toque da minha mãe no meu
rosto. Quanto amor! Não consigo. Quem sou eu nessa estória? Pouco importa. Sigo
adiante. Não olho pra trás. Melhor assim.
*Marcelo D’Alencourt é cientista
político
3 comentários:
Sensível e triste! Parabéns Marcelor
Puta verdade,
Muito bom
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